quarta-feira, dezembro 31, 2008

os bancos

Recebi, como é normal todos os meses, uma carta do banco com o extracto mensal dos débitos e dos créditos. Só que, desta vez, o quadro contabilístico vinha acompanhado com uma espécie de comunicado, avisando com seriedade o cliente que, a partir de agora, uma conta a descoberto vai ser taxada com uma multa diária à ordem de vinte euros por dia. Todo o teor da carta era mais ou menos assim, notando-se, em cada palavra, em cada linha, em cada letra impressa um ajuste de contas com a vida. Tenho pena de a ter remetido para o lixo, apesar de ser o lugar onde melhor se enquadra. Mas tenho a certeza que no próximo mês os mesmos caracteres aparecerão, circunspectos, na minha caixa de correio. O que verdeiramente me espanta é o meu espanto na leitura da missiva. Pensava que os senhores dos bancos tinham ainda um pouco de vergonha na cara. Ou nas montras.

segunda-feira, dezembro 29, 2008

o não caos nos hospitais

A ministra Ana Jorge rejeitou a ideia que se viveu, em alguns hospitais, um caos. Refere mesmo, desassombrada, que "houve uma excelente resposta de todos os serviços de saúde". Confesso que nunca esperei doze horas numa urgência para ser atendido. Mas a ideia que eu tenho de entropia não anda muito longe do que milhares de pessoas viveram nestes últimos dias em redor de (algum) sistema hospitalar português.

segunda-feira, dezembro 22, 2008

um pouco de ideologia (actualizado)

José Sócrates falou de improviso num seminário promovido pelo Diário Económico que tinha como tema "Como crescer em tempo de crise". Foi, talvez, uma das peças de cariz mais ideológico do primeiro-ministro. Na verdade, essa marca ficou desde logo patente no início da sua intervenção quando, desassombradamente, referiu que "é preciso agir sem ortodoxia e sem ideias feitas", adiantando que "é preciso estar com a mente aberta para responder aos problemas e não para responder às necessidades da nossa ideologia. Precisamos de ter mente aberta e não ficarmos reféns da ideologia ou das respostas clássicas, porque problemas novos exigem respostas novas". Acusou ainda, de modo implícito, todos os outros – os que são incapazes de mergulhar nesta sua visão – de estarem presos a amarras do passado, que mais não são do que teias de aranha condicionadas por sistemas ortodoxos do pensamento.
Esta reflexão um tanto silogística do primeiro-ministro revela, mais do que tudo, um tipo de político que tem grassado nos últimos anos na atmosfera da realpolitik europeia. Com efeito, é este tipo de "homem novo" (hodierno) que faz com que olhemos, por exemplo, para José Sócrates e Durão Barroso e não consigamos vislumbrar uma qualquer linha de orientação diferenciadora, pois é como se os dois tivessem saído da mesma linha de montagem. É também esta idiossincrasia que apazigua certos paradoxos discursivos e decisões contraditórias. No caso de Barroso, o facto de ter “dado à sola” dois anos após ter sido mandatado pelo povo português para liderar um governo revela, antes de tudo, o quanto é que o cargo representava para o actual presidente da Comissão Europeia. No que diz respeito a José Sócrates, absovem-se-lhe certos dislates dedutivos, como quando referiu, em início de Dezembro, que 2009 será um bom ano para os portugueses (“vão ganhar poder de compra como não ganhavam há muitos anos”) e, passados quinze dias, sublinhou que, afinal, 2009 vai ser “o Cabo das Tormentas, um ano difícil e exigente”. É, pois, esta casta de políticos, que foge de um qualquer assomo de ideologia política como o diabo foge da cruz. Tudo em nome do chamado pragmatismo político, da acção, que mais não é, afinal, do que uma certa hipocrisia que tem como base a sustentação no poder a todo o custo, ou, até ver, até onde o sistema democrático o permitir. Mas é esta mesma filosofia que, paradoxalmente, torna incapaz o governo de protagonizar acordos interpartidários (em comissões parlamentares, por exemplo) a respeito de causas tão prolongadas no tempo como a educação (serve, igualmente, de exemplo). Tudo em nome, afinal, do tal pragmatismo, da não entronização das “respostas clássicas” que frisava José Sócrates. Mas não contemplo, em matéria política, nada mais “clássico” do que este tipo de procedimento.
E é esta plataforma humana que liderou os destinos da humanidade nos últimos decénios. São os mesmos, agora, que são incapazes de alinhavar um entendimento diacrónico do percurso avassalador duma economia de costas voltada para o ser humano. Por isso, andam agora perdidos. E, à míngua de ideologia, querem respostas para amanhã. E nisso eles são bons. O amanhã que se recria constantemente. Até um dia.

(publicado no jornal A Voz de Trás-os-Montes em 01/01/09)

terça-feira, dezembro 16, 2008

santana candidato

Ser Santana Lopes o candidato de Manuela Ferreira Leite para a Câmara de Lisboa merece comentário. Confesso que sempre pensei que a líder do PSD aguentasse este ímpeto vertiginoso. Mas enganei-me. Santana, claro, começou logo por nos brindar com declarações destas: "É um desafio que abraçarei com todas as energias. É uma honra que aceito com todo o empenho e um combate que farei com toda a determinação, lutando pela vitória nas eleições, mas falarei sobre o assunto quando entender que é a altura certa". Quinta-feira serei um dos espectadores atentos da Quadratura.

a prisão de mário soares

Sei que Mário Soares não é dado a pessimismos crónicos. Sei também que deu uma grande lição de humildade quando se candidatou às últimas eleições presidenciais e perdeu. O que não entendo é como, num dia, avisa os críticos (internos) de José Sócrates, salientando a vacuidade dos seus reparos para, logo no dia seguinte, escrever isto: "a crise aprofunda-se e generaliza-se. Os Estados desviam milhões, que vêm directamente dos bolsos dos contribuintes, para evitar as falências de bancos mal geridos ou que se meteram em escandalosas negociatas. Será necessário. Mas o povo pergunta: e as roubalheiras, ficam impunes? E o sistema que as permitiu – os paraísos fiscais –, os chorudos vencimentos (multimilionários) de gestores incompetentes e pouco sérios, ficam na mesma? E os auditores que fecharam os olhos – ou não os abriram suficientemente – e os dirigentes políticos que se acomodaram ao sistema, não agiram e nem sequer alertaram, continuam nos mesmos lugares cimeiros, limitando-se a pedir, agora, mais intervenções do Estado, com a mesma desfaçatez com que antes reclamavam "menos Estado" e mais e mais privatizações?"
Será que o ex-presidente da República não entende que esta sua linha de pensamento vai ao encontro do que foi, por exemplo, o paradigma analítico que constituiu o recente fórum da esquerda, em que Manuel Alegre marcou uma presença assinalada?
Parece que Mário Soares se encontra numa espécie de prisioneiro da sua própria deliberação, a partir do momento em que aceitou ser candidato presidencial pelo Partido Socialista. Neste sentido, José Sócrates jogou e ganhou, ao agrilhoar o expansionismo crítico do fundador do Partido Socialista.
Neste sentido, só nos resta esperar que Mário Soares, objectivamente, se decida. É que não chega proclamar – e bem! – uma maior justiça social (a todos os níveis) para depois se colocar ao lado de um governo que pouco ou nada tem a ver com isso. Aliás, o fórum das esquerdas surgiu num governo de esquerda. Não é sintomático?

mais uma oportunidade perdida

Esta crise deveria ser aproveitada para um desenvolvimento sustentado do país. No entanto, não me parece que a aposta do governo vá ao encontro desta perspectiva. Faz parte da nossa idiossincrasia, enquanto nação, o não aproveitarmos certas conjunturas económicas. Foi assim com os Descobrimentos, o ouro do Brasil e, na nossa contemporaneidade, a entrada na CEE. Agora o dinheiro escasseia, como é óbvio, mas um conjunto de empreendimentos se anuncia. Porém, não se trata de um conjunto de empreendimentos. Deveria antes ter escrito: um punhado de grandes obras públicas. O adjectivo torna-se, pois, necessário para caracterizar a aposta do governo no relançamento da economia. Não quero aqui esboçar uma crítica ao paradigma de sustentação económica. O mundo ocidental encontra-se nele mergulhado, como se mais nenhuma alternativa houvesse. Na verdade, o que aqui merece comentário crítico tem a ver, essencialmente, com uma gestão preconceituosa dos dinheiros públicos, os quais deveriam existir enquanto verdadeiros fundos de coesão nacional. Por que razão a aposta não é, definitivamente, na homogeneização do território nacional, enquanto país com índices de desenvolvimento desiguais? Mantinha-se o tradicional desígnio nacional das obras públicas, só que com uma grande diferença: deixava-se a fobia do TGV, do aeroporto, da "auto-estrada da justiça", para apostarmos em salas de aulas adequadas, em hospitais condignos, em tribunais remodelados, em passeios aprimorados, em estradas aperfeiçoadas, em caminhos-de-ferro relançados, em cidades equilibradas, etc.
Mas os nossos governantes nunca gostaram de micro-empreendimentos. Pensam tudo em grande. Gostam de deixar assinatura. É por isso que sabemos que foi D. João V que mandou construir o Convento de Mafra, D. Manuel I o Mosteiro dos Jerónimos, o Mosteiro da Batalha por D. João I (com a ajuda divina da Batalha de Aljubarrota), a Ponte 25 de Abril, outrora Salazar, por...Salazar, o Centro Cultural de Belém por Cavaco Silva, e por aí adiante. Aliás, não é menos verdade que muitas vezes uma espécie de cognome se cola aos responsáveis maiores de um período histórico específico (muitas vezes também num processo identitário de auto-designação): o das auto-estradas, o do túnel, etc.
No entanto, é curioso verificar como se ganham eleições com este tipo de (des)sustentação económica. Daí a questão: será que não merecemos este tipo de políticos?

(publicado no jornal A Voz de Trás-os-Montes em 24/12/2008)

terça-feira, dezembro 09, 2008

a proposta de guilherme silva

Li por acaso a extraordinária proposta do não menos extraordinário deputado do PSD (eleito pelo círculo eleitoral da Madeira), que consiste em acabar com as sessões plenárias às sextas-feiras. Há coisas que não se devem dizer, principalmente numa altura destas. Guilherme Silva não tem, pois, nenhum tacto político. Vejamos a justificação dada: "é preciso perceber que o Parlamento tem uma representação de deputados de todo o país [e que] a deslocação dos deputados para regressarem aos fins-de-semana às suas famílias tem uma componente humana que também é respeitável". Eu aplaudo, desde já, Guilherme Silva. Não sei bem porquê, mas tem o meu mais comovido aplauso.

o ordenado de vítor constâncio e os outros

Vítor Constâncio, governador do Banco de Portugal, pode, orgulhosamente, colocar-se sem ser em bicos de pés ao lado dos seus homólogos europeus. De facto, o seu ordenado em nada fica atrás aos deles, ultrapassando mesmo alguns presidentes de bancos centrais, com um nível de vida objectivamente superior ao nosso. E é precisamente neste ponto que importa reflectir. Na verdade, os ordenados dos chamados dirigentes de topo das empresas públicas (directores gerais, etc.) - e mesmo da classe política - não ficam nada a dever aos seus congéneres europeus. O que realmente se encontra a léguas dos países mais desenvolvidos da União é o ordenado médio e... mínimo. Basta comparar.

a auto-estrada da justiça

Auto-estrada da justiça é a denominação que José Sócrates aprontou para a auto-estrada que vai ligar Amarante a Bragança. Este tipo de nomenclatura diz muito mais a respeito do homem do que da obra. De facto, José Sócrates já nos habituou a estes desvarios próprios de um qualquer empresa de publicidade ou, no mínimo, de um qualquer técnico de marketing. Talvez seja o relacionamento profundo e prolífico com as chamadas agências de comunicação o principal culpado destes devaneios simbólicos.
No seguimento da imagística metafórica criada pelo primeiro-ministro, li outro dia, no Diário de Notícias, um excelente artigo (não sei o nome da autora nem o dia da edição), em que se faz uma oportuna reflexão sobre o nosso mapa de estradas e auto-estradas. A autora chega à conclusão que há, em Portugal, auto-estradas em excesso. De facto, basta um olhar atento para o recorte de um mapa de estradas actualizado e verificamos que muitas das auto-estradas não são mais do que acumulações de erros de planeamento. Dou uma ajuda: na zona do Oeste podemos encontrar as seguintes auto-estradas: A1, A25, A13, A10, A15, A23. Tudo numa extensão geográfica diminuta. Agora, chega finalmente a Trás-os-Montes, para gáudio daqueles autarcas sonhadores, a esperança dum caminho mais célere e vistoso para Lisboa.
Porém, estas idealidades, implausíveis, fazem com que sejamos, ao nível da União Europeia, um dos países com maior número de auto-estradas. Vejamos alguns dados, segundo a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico:
Na UE a 25, Portugal tem uma média de auto-estradas por rede viária de 2,3% – muito acima dos 1,2% da média (é o terceiro valor mais elevado, depois da Espanha e Luxemburgo); a União Europeia tem 13 km de auto-estradas por 100 mil habitantes, quando Portugal tem 17 km; por cá existem 20 km de auto-estrada por 1000 km2 do país, enquanto a média da UE são 15 km; Portugal foi o segundo país que desde 1990 e até 2006 registou a maior expansão na rede; é também o segundo país com mais quilómetros (8,3 km) por mil milhões de dólares de PIB, apenas ultrapassado pelo Canadá.
Tudo isto faz-nos naturalmente reflectir sobre o país que temos e que queremos. Tudo isto coexiste com – pasme-se! – o mau estado das estradas (nos gastos com manutenção, caímos para 10.º lugar, com 177 milhões de euros!...), com salas de aulas apinhadas de alunos, com escolas sem condições didácticas plenas, com salas de espera de hospitais miseráveis, com deputados que faltam muito às sextas feiras, etc. etc. etc.
Deste modo, o que se prevê, na aspiração legítima da superação da crise económica que já grassa entre nós, é mais uma oportunidade perdida. Não que a receita (previsível, aliás) em obras públicas esteja errada. O que me parece desacertado é não se aproveitar todas as sinergias para modernizar efectivamente o país. E esta modernização dever-se-ia enquadrar não nos vistosos TGV’s e aeroportos, mas antes nas pequenas empreitadas que alinhariam Portugal nos países verdadeiramente civilizados.

(publicado no jornal A Voz de Trás-os-Montes em 18/12/2008)

segunda-feira, dezembro 08, 2008

a honradez do cargo de deputado

Registo somente o parecer de Regina Bastos, vice-presidente da bancada do PSD. Afirma a deputada que o papel de deputado não se compadece com sanções pecuniárias", face à horadez e dignidade do cargo.
Naturalmente que sim, pois os deputados representam, na chamada "casa da democracia", o povo português e, só esse facto, lhes confere uma dignidade sem paralelo relativamente a outros cargos representativos. Acontece que estão mal habituados. E o que se passou recentemente com as faltas dos deputados do PSD em número suficiente para fazer passar uma lei votada no Parlamento (a suspensão dos professores, imagine-se!), revela bem o nível dos nossos representantes. É que estes senhores,segundo rezam as crónicas internas do PSD, foram previamente avisados da importância da votação. Mesmo assim, preferiram baldar-se, esquecendo-se que também representam muitos milhares de professores que acreditaram nas suas representações.

sábado, dezembro 06, 2008

a independente elisa ferreira

Elisa Ferreira discursa neste momento na televisão, numa entrevista ao canal 2 e à Rádio Renascença. Confesso que me está a desiludir um pouco. É uma personagem simpática, mas não consegue sair duma certa anemia intelectual. Por exemplo, não conseguiu explicar por que se candidata a deputada ao Parlamento Europeu e a presidente da Câmara do Porto; espalha-se quando disserta sobre o que é ser de esquerda hoje em dia; não entende a educação e esboça umas críticas aos professores grosseiras, do tipo "os professores faltavam e não lhes acontecia nada" (ai o Parlamento Europeu...). Mas o que me espantou verdadeiramente é a capacidade que os independentes têm de se transfigurarem, ao ponto de serem os primeiros a defenderem o partido que não têm. Jorge Coelho nunca gostou de independentes dentro da máquina partidária. Lá tinha as suas razões.

as ausências e paulo rangel

Curiosas são também as declarações de Paulo Rangel, presidente do grupo parlamentar do PSD, ao afirmar que "os números decisivos foram os do PS" e não, como deixou implicitamente sublinhado, as três dezenas de deputados do seu partido que não compareceram à votação. Paulo Rangel defende-se de forma angélica, partindo do pressuposto que se todos os deputados estivessem presentes, o diploma do CDS-PP – pedindo a suspensão do modelo de avaliação dos professores – naturalmente não passaria, visto que a maioria absoluta mora, como sabemos, no lado do Partido Socialista. Acontece que, mesmo com 121 deputados que fazem parte do partido do governo, o PSD ainda conseguiu marcar mais ausências do que o PS: 30 a 13.
Mas o que se torna revelador, no meio disto tudo, é a forma hipócrita como os responsáveis políticos olham para os problemas da população em geral e, neste caso, para a avaliação dos professores. É que eu vi, como todos os portugueses viram, muitos dos principais líderes da oposição, designadamente do PSD, exigirem a suspensão deste processo de avaliação. Ora, quando, finalmente, existe uma proposta partidária – neste caso, do CDS –, a qual, ao nível do Parlamento, podia efectivamente suspender todo este imbróglio, os senhores deputados (que representam o povo português, convém sempre sublinhar esta verdade teórica) não compareceram à votação do diploma. No meio de tudo isto, Manuela Ferreira Leite chamou Paulo Rangel para lhe pedir esclarecimentos, frisando que este triste acontecimento jamais se poderá repetir. Acontece que "este triste acontecimento" não é virgem na história recente do parlamentarismo português. De facto, situações como esta já decorreram por várias vezes e o resultado tem sido, invariavelmente, sempre o mesmo: "isto não pode tornar a acontecer". Mas acontece e acontecerá, enquanto não tivermos, ao nível dos senhores que se sentam naquelas cadeiras da Assembleia da República, um verdadeira representação democrática do povo português.

a suspensão por um fio

Ao que parece, foi mesmo verdade que a suspensão da avaliação dos professores não ocorreu hoje no Parlamento porque faltaram trinta deputados do PSD. Quer isto dizer que também não compareceram não sei quantos do PS. Tudo isto revela a distância entre o ser e o parecer. Afinal, não anda o PSD a proclamar o fim desta pseudo-reforma da educação? E o PS? Não deseja o contrário? E não aparecem à votação?!...

quinta-feira, dezembro 04, 2008

os ajudantes da ministra

Um diz que uma greve de quase 100% de adesão não ultrapassou os 61% e que estes foram, apesar de tudo, significativos; outro interpreta mal as palavras que a ministra proferiu na Assembleia da República, quando esta admitiu um novo modelo de avaliação.
De facto, o clima para os lados do Ministério da Educação adensa-se de forma incontornável. Mas vale a pena colocar uma questão: a quem serve este clima de guerrilha? Resposta provável: a José Sócrates. Lá para Janeiro, com o cheiro das eleições a aflorar, o nosso primeiro vai desbloquear, admiravelmente, a situação.

a greve e alguns grevistas

Fazer greve é uma coisa. Fazer greve e ir para as portas das escolas é outra. Fazer greve e ir para as portas das escolas cantarolar umas músicas com letras pretensamente humorísticas em que a ministra é, invariavelmente, o centro das atenções é, ainda, outra coisa. Não sei se a chamada classe docente sabe, mas a divisão (entre professores e professores) também se pode regular neste tipo de sinais. Provavelmente, até seria um bom método de discriminação.

segunda-feira, dezembro 01, 2008

bpp e outros bancos

Por muito que cogite, não consigo entender o que leva seis bancos a financiar um outro banco. Ainda para mais quando a maior parte desses seis bancos já afirmou, categoricamente, que vai recorrer ao aval de 20 mil milhões de euros que o Estado disponibilizou para... não afundarem! Para além disso, podemos esboçar a seguinte questão: quem serve mesmo o Banco Privado Português? E, já agora, o BPN?...

quinta-feira, novembro 27, 2008

magalhães para timor

Gostei também de ouvir Xanana Gusmão falar do Magalhães...

(adenda: tenho mesmo que acrescentar que a frase de cima tem que ser olhada através "do manto diáfano da fantasia...")

a avaliação

O processo de avaliação dos professores encontra-se numa grande confusão, em que todos os protagonistas - ministério, sindicatos e professores - tentam, de algum modo, salvar a face. A ministra, que até aqui parecia um muro de betão armado, começa a dar sinais de evidente recuo, ao aligeirar, desarranjadamente, aquilo que apresentou como um projecto final. Acontece que as alterações propostas implicam, neste momento, uma confusão acrescida, em que o que era obrigatório antes, se tornou agora alternável, assim como varia - e de que maneira - o grau de importância de certos procedimentos. Ora, tudo isto nos faz reflectir sobre a efectiva capacidade da gente que gravita nos corredores do ministério da educação. A mim, pessoalmente, nunca me enganaram, ao contrário do que se passou com a maioria dos comentadores políticos da nossa praça, que sempre vislumbraram em Maria Lurdes Rodrigues uma espécie de D. Sebastião de saias. Alguns ainda resistem no panegírico. Mas estou em crer que esse (apesar de tudo) parco clima laudatório que ainda subsiste tem mais a ver com o desconhecimento do processo educativo. O regozijo com que a Ministra e Secretários de Estado se manifestaram relativamente à subida da média nacional de algumas disciplinas é exemplo da maneira como a educação é encarada. É que ninguém pode acreditar que, de um ano para o outro, a "reforma" (naturalmente entre aspas) começa a dar resultados palpáveis. Em educação, qualquer processo transformador tem que aguardar alguns anos (um ciclo de estudos?) para que os somatórios se possam espelhar num quadro comparativo. O PISA 2009 está aí à porta e, ou muito me engano, ou vamos ter uma grande decepção.
Por outro lado, os sindicatos não estão, neste momento, numa situação melhorada. Vieram agora com a exigência (normal e aconselhável) de suspender o processo de avaliação, ao mesmo tempo que propõem uma espécie de documento de auto-avaliação, o qual será acompanhado pelo conselho pedagógico. Dizem eles que é "uma solução simples, não administrativa e focada na vertente pedagógica que permita aos docentes serem avaliados este ano". Pois está visto que sim. Simples até demais. Na verdade, mais simples do que o que existia até então. A mensagem desta proposta não pode ter vindo na pior altura. Bastava aos sindicatos afirmarem desavergonhadamente, o seguinte: nós propomos reconstrução da avaliação que existia. Ponto final. Seria, portanto, a base de trabalho de um novo processo de avaliação. O que agora os sindicatos alvitraram é pior do que existia. A situação a que se chegou é, pois, caricata: de um lado, o ministério a remendar o que, concludentemente, sugeriu; do outro, o sindicato a inventar, aligeirando ainda mais o modelo que existia. Dito de outra maneira, ambos estão presos às suas próprias irredutibilidades.

(esboço do artigo publicado no jornal A Voz de Trás-os-Montes em 04/12/2008)

terça-feira, novembro 25, 2008

os cartazes em louvor de sócrates

Começa-me verdadeiramente a incomodar alguns cartazes que aparecem na televisão, aquando das visitas de Sócrates para inaugurar alguma coisa ou para distribuir não sei o quê num qualquer sítio carenciado, com mensagens tão asneadas como "obrigado Sócrates". Que eu saiba, era assim que Salazar era muitas vezes recebido em alguns desses lugares, por algumas pessoas que, curiosamente, são as mesmas que agora empunham esses ditos. Ou melhor, as mesmas (de carne e osso) naturalmente não podem ser, mas o princípio, esse desarranjo social que foi paulatinamente alicerçado na sociedade portuguesa do Estado Novo, persiste em se manter como uma verdadeira idiossincrasia psiconormativa da embriaguez política de alguns políticos.

sexta-feira, novembro 21, 2008

os remendos da ministra

A pergunta que deve ser feita, no meio de toda esta nevrose educativa, é a seguinte: o que levou Maria de Lurdes Rodrigues a alterar o que até então parecia inatacável? Apesar da retórica de costume, estou em crer que esta atitude da ministra a coloca num estado de fragilidade extrema. Pior do que isso, revela que se perdeu imenso tempo numa simples teimosia. Daí que a demissão deveria ter sido o posicionamento (político e intelectual) mais honesto.

terça-feira, novembro 18, 2008

hino ao cinismo político

Se podemos erigir declarações que desenvolvam cristalinamente o âmbito do despudor político, o que Pedro Passos Coelho afirmou de Manuela Ferreira Leite (a respeito do que esta disse sobre um hipotético congelamento da democracia por seis meses) revela-se, de forma peremptória, um verdadeiro paradigma. Vale a pena transcrever:
"[Manuela Ferreira Leite] corrigirá com certeza as suas afirmações [porque] não pode ter querido dizer aquilo que disse (...) todos temos dias melhores e dias piores e hoje não foi certamente um dia em que a dra. Ferreira Leite tenha estado bem, até porque há matérias em que um candidato a primeiro-ministro não pode deixar dúvidas nem ironizar (...) Tenho a certeza que a dra. Ferreira Leite não deixará de corrigir com rapidez o que não pode ter querido dizer".
O melhor, claro, vem no final: "Não contem comigo para estar a castigar publicamente a presidente do PSD, do meu partido".
Claro que não, Pedro, claro que não!...

maria de lurdes rodrigues

Ouvi agora Maria de Lurdes Rodrigues admitir que o processo de avaliação de professores é complexo, burocrático, activador de trabalho excessivo nas escolas... Não entendo como é que alguém consegue defender este modelo de avaliação, o qual abarca todas estas inoperâncias práticas e estruturantes.

manuela, a desajustada e... josé sócrates

Este post é também sobre Manuela Ferreira Leite. Mas o que me apraz dizer a respeito do "Eu não acredito em reformas, quando se está em democracia" e do "Quando não se está em democracia é outra conversa, eu digo como é que é e faz-se", e ainda do "E até não sei se a certa altura não é bom haver seis meses sem democracia, mete-se tudo na ordem e depois então venha a democracia", é que José Sócrates nasceu realmente num belíssimo dia de sol. Sabemos como é que chegou a líder do PS, com a trapalhada do Jorge Sampaio ao nomear Santana Lopes para formar governo e com a consequente demissão de Ferro Rodrigues da liderança do Partido Socialista. Veio depois a ajuda de Santana na obtenção da maioria absoluta (o pior resultado do PSD e o melhor do PS em legislativas). Seguiram-se líderes tão extraordinários como Marques Mendes (tendo em conta o que se seguiu, pode-se considerar que foi o melhor líder do PSD na oposição ao PS) e Filipe Menezes. Agora, depois das brumas e do nevoeiro desanuviarem, eis que surge aquela que arrumaria a casa política social democrata, de seu nome Manuela Ferreira Leite, a qual, por norma, aparecia sempre montada numa áurea cavaquista.
Ora, não foi difícil determinar que Manuela não tinha perfil para o cargo. Daí que surjam os teóricos da sociopolítica a desenvolverem as tradicionais teses da génese do PSD. Neste âmbito, a repetição é a norma: um partido que vive de líderes carismáticos (qual o que não vive?!) e de que desde Cavaco Silva esse pressuposto esteve inalteravelmente ausente, a vacuidade programática (em oposição aos princípios europeus social-democratas do PS), o PSD como um partido do poder e que, na oposição, respira maus ares, os barões, os baronetes, etc.
Deste modo, José Sócrates pode dormir descansado. Não será daqueles lados que a friagem assomará. Falta saber qual dos lados terá mais força para desproteger não só o PS como o PSD: se a direita ou a esquerda. Ou os dois.

segunda-feira, novembro 17, 2008

os cara tapada

Que raio de sentimento de impunidade pairará na massa encefálica de algumas criaturas quando, por exemplo, se dirigem, ameaçadora e disfarçadamente, aos polícias e jornalistas que esperam, à porta do tribunal, os seus colegas de uma claque de futebol, os quais hão de chegar numa carrinha celular? Na verdade, esta gente que anda por aí em claques de futebol ditas organizadas, muitas das quais parecem pequenas empresas, tem, a meu ver, tempo de antena a mais. Daí que a comunicação social, que gosta deste tipo de manifestações energúmenas, tenha também a sua quota-parte de responsabilidade. Aliás, é muito difícil, hoje em dia, desanexarmos a importância da televisão (um dos grande educadores dos tempos que correm) do que de muito de medonho se passa na nossa sociedade. Neste sentido, basta olharmos com atenção para as grelhas dos três canais generalistas, para a boçalidade que lá grassa, para entendermos que caminhamos para uma espécie de deseducação social e cívica. Assim, quando estes meninos deixarem de aparecer nos ecrãs das televisões, desencadear-se-á nesse mesmo instante o início do fim das suas efémeras relevâncias.

domingo, novembro 16, 2008

o fim do silêncio de manuela ferreira leite

Afinal, estava tudo programado. Manuela Ferreira Leite, a pouco mais de meio ano de um processo eleitoral longo e previsivelmente desgastante, iniciou um conjunto de ataques sectoriais à governação socialista. Dois alvos, por agora, e logo dos mais fragilizados (apetece perguntar: quem são os ministros deste governo que não se encontram em posições delicadas, muitos deles completamente desacreditados?...): a educação e a agricultura. No entanto, a líder do PSD não se livra das críticas. Agora já não por não falar, mas antes por falar e não apresentar alternativas. É um facto que Manuela costuma pôr-se a jeito, isto é, realiza (do ponto de vista verbal), alguns disparates (relação casamento procriação, por ex.). Mas também parece certo que a candidata a primeiro-ministro manifesta umas parecenças, relativamente ao modus operandi, com o seu amigo Cavaco Silva. Deste modo, estou propenso a crer que dentro de um ou dois meses elas (as propostas) aparecerão. Até lá, Manuela Ferreira Leite continuará a alimentar o escárnio jornalístico. E este, como sabemos, também conta.

sexta-feira, novembro 14, 2008

o exemplo dos professores de viseu

Alguns professores de Viseu vão processar José Sócrates por este ter afirmado que os professores nunca foram avaliados. Pela minha parte, congratulo-me pelo facto de as televisões terem finalmente dado relevo a uma verdade indesmentível. Com efeito, os professores sempre foram avaliados. É verdade que o processo de avaliação dos professores caiu numa espécie de inoperância orgânica. Todavia, tal facto não tinha obrigatoriamente que resultar na confusão que actualmente se vive. E se a culpa é maioritariamente da equipa de Maria de Lurdes Rodrigues, a qual se meteu num processo de avaliação sem saber ao certo do que se tratava (ao jeito de um experimentalismo pseudo-paliativo), também é verdade que os professores desde muito cedo se envergonharam na avaliação que haviam praticado até então nas escolas. Assim, bastaria a sustentação reiterada dessa verdade (com a óbvia determinação de desejar melhorias nesse mesmo processo avaliativo), para que a razão sempre morasse no lado das escolas, isto é no lado dos professores (afinal, as escolas são os professores e não o ministério). Mas não! Conhecedora das fragilidades da classe, Maria de Lurdes Rodrigues nunca desarmou e, teimosa e inscientemente, tenta levar a bom termo uma avaliação obtusa e incoerente.

(esboço do artigo publicado no jornal A Voz de Trás-os-Montes, em 20\11\2008)

quinta-feira, novembro 13, 2008

as desculpas de maria de lurdes

"Peço desculpa aos senhores professores de ter causado tanta desmotivação, mas é do interesse do país, dos alunos e das escolas. Espero que as escolas, os alunos e o país possam beneficiar desta disponibilidade dos professores para estar mais tempo na escola, é isso que eu espero".
É este tipo de frase, cínica na sua essência, que desacredita todo o edifício político do país. De facto, quando se olha para a ministra da educação declarar, com uma extraordinária candura, as desculpas aos professores pela desmotivação causada, não se vê mais do que a parte abjecta da política. Para além disso, nota-se que lhe restam já poucas, pouquíssimas saídas dignificantes deste seu cubículo infernal em que se tornou o seu ministério. Maria de Lurdes Rodrigues é, politicamente, inábil. Os seus secretários de estado são inábeis em tudo. Pelos vistos, querem afundar acreditando, sozinhos, num sistema de avaliação que ninguém aceita. É lá com eles. Mas o facto de não colocarem o lugar à disposição de Sócrates (o mínimo acto público que, nestas circunstâncias, é exigido) é revelador do perfil democrático desta gente.

a ministra, os secretários, os ovos, os tomates e os alunos

Lembram-se da aluna do Carolina Michaelis, no Porto, empurrando a professora por causa do seu telemóvel? Pois bem, multipliquem essa aluna por 200 ou 300, coloquem-nos às portas das escolas aquando de uma qualquer visita da ministra ou dos secretários de estado, e o resultado é uma espécie de omeleta de tomate. Ora, tanto o episódio de Fafe (as declarações do extraordinário presidente da Câmara, acusando os professores de mentores daquela turba, são verdadeiramente mentecaptas), como o da Escola Secundária D. Dinis, em Lisboa, revelam o perfil civilizacional da maior parte dos alunos das nossas escolas públicas. Daí que não entenda as declarações de duas professoras (daquela escola?), ao afirmarem, imbecilmente, que aqueles alunos são pacíficos e que nunca fizeram mal a ninguém. No entanto, estes amontoados de alunos vão, paradoxalmente, ao encontro das reivindicações dos professores no que diz respeito ao processo da avaliação de que estão a ser alvo. Explicando: alunos que contestam desta maneira uma ministra e dois secretários de estado, procederão, decerto, bem pior (numa relação proporcional ao processo de ensino-aprendizagem) dentro de uma sala de aulas. Daí que a Ministra da Educação deva reflectir no seguinte: esta atitude dos alunos é também um reflexo das políticas educativas que têm vindo a transformar - para pior - as escolas e, particularmente, o nível moral e cívico dos alunos. Numa perspectiva sistémica, em educação tudo se encontra interligado. Maria de Lurdes Rodrigues deveria saber isso.

terça-feira, novembro 11, 2008

a rentabilização dos estádios de futebol

Há assuntos que os governantes, mais tarde ou mais cedo, se vêem impelidos a aderir. Um mundial de futebol é um deles. Daí que Silva Pereira, o nosso ministro da Presidência, tenha dito que a ideia da organização (conjunta, com Espanha, até ver...) do mundial de futebol de 2018 pode ser uma boa forma de rentabilizar os estádios construídos aquando do Euro 2004. Como se sabe, a tendência megalómana e provinciana dos nossos governantes (um mal patológico do país) fez com que ficássemos com infra-estruturas desportivas à imagem da desigualdade social do país. Neste sentido, lembro-me de ver, quando foram apresentados os estádios para o Euro, a linha geográfica das cidades locatárias e dar por mim a reflectir (a concluir) que essa mesma linha não podia espelhar melhor a discriminação (outra imagem de marca do país) secular que o interior de Portugal tem sido alvo. Agora, Silva Pereira não arranja melhor argumento do que o da rentabilização dos estádios. Mais valia ter assumido, descomplexadamente, mais este "desígnio nacional".

o recado de manuel alegre

É evidente que concordo com os estados de alma de Manuel Alegre no que diz respeito à obsessão desastrosa de Maria de Lurdes Rodrigues para com todo este processo da avaliação dos professores e, particularmente, para com a manifestação que juntou a quase totalidade dos docentes, em Lisboa. De facto, Alegre anota dois ou três pontos importantes, os quais necessitam de debate urgente. Por exemplo, os programas e os conteúdos do ensino e também (acrescento eu) a própria carga horária completamente desajustada, assim como a primazia que se tem vindo a dar, de há uns anos para cá (em nome daquilo que se costuma designar por Ciências da Educação) das chamadas áreas curriculares não disciplinares. Já aqui escrevi a minha posição relativamente a este último aspecto. Com efeito, não consigo perceber, mesmo com muita força de vontade, as 4, 5 horas que os alunos do 2 e 3º ciclo do ensino básico passam, por semana, ao redor destas disciplinas. Bastaria olhar para o crescente aumento de casos de indisciplina nas escolas em alunos destes níveis de ensino, para verificarmos a inocuidade destas áreas disciplinares.
Todavia, o que me custa mais a entender, do ponto de vista de Alegre, é a sua preocupação relativamente a um resultado eleitoral que não permita ao PS alcançar a maioria absoluta. De acordo com o seu raciocínio, a continuação de Maria de Lurdes Rodrigues como ministra da Educação pode custar ao PS a maioria absoluta nas próximas eleições legislativas. Na verdade, na minha candura, nunca pensei que Alegre estivesse alguma vez preocupado com a maioria absoluta do PS. Na minha ingenuidade, eu até pensava que Alegre era contra a renovação dessa mesma maioria. Mas enfim, Alegre, o poeta-deputado; Alegre, o militante independente, Alegre, o ex-(e futuro)candidato presidencial é, afinal, também ele, um político... com tiques de político.

domingo, novembro 09, 2008

a reacção de sócrates e maria de lurdes à manifestação de professores

Houvesse outra oposição, ou melhor, estivesse o PSD mais bem posicionado nas sondagens e Lurdes Rodrigues estaria já despedida deste governo socialista. Com efeito, as reacções de ambos os governantes à manifestação de professores são impensáveis num governo com um mínimo de cultura democrática. Como é possível que justifiquem este extraordinário movimento contestatário de uma classe profissional (4 em cada cinco professores aderiu à manifestação...) de "lamentável oportunismo dos partidos políticos" (Sócrates) e de que tudo não passou de uma "forma de pressionar a ministra da Educação porque é ano de eleições" e que "perante ameaças e chantagens deste tipo, a minha reacção é de uma total tranquilidade e de um sorriso" (Lurdes Rodrigues)?!... Alguém com bom senso e de boa fé acredita que, com esta adesão em massa dos professores, o processo avaliativo em curso nas escolas é, de facto, o melhor para garantir "a qualidade do sistema de ensino, que permita distinguir aqueles que são os melhores professores" (Lurdes Rodrigues)? Na verdade, o que para muitos era, de certa forma, o resultado de um programa político bem pensado para o sistema educativo português, transformou-se agora numa simples obsessão por parte da ministra e dos seus secretários de estado. Neste sentido, basta olharmos para as declarações de Maria de Lurdes Rodrigues, quando afirma, por exemplo, num apaziguamento de alma desconcertante, que "estão criadas condições institucionais e legais para que se concretize a avaliação" e que "não tem sentido para mim falar de outro modelo de avaliação" e ainda que "suspender [o processo de avaliação] significa desistir e eu não desisto”, para facilmente aferirmos que o que está aqui em causa será mais facilmente intuído dentro de uma perspectiva psicológica.

santana lopes igual a santana lopes

Santana Lopes deu hoje uma longa entrevista ao Público. Devo dizer que acho um exagero toda a celeuma que se cria em volta da personagem, a respeito do seu sistemático e putativo regresso à vida política. Na verdade, Santana nunca dela saiu. E, para mais, ele tem todo o direito de querer contribuir, com o seu auto-proclamado virtuosismo, para o desenvolvimento do país. Neste ponto, a comunicação social não é imparcial, visto que outros não são assim tratados, embora haja razões para que isso aconteça. Mas Santana é especial. E a entrevista, delirante, prova isso. Não vou tratar aqui os pontos vincadamente políticos da sua análise. Com efeito, o ex-presidente do PSD não consegue sair do claustro analítico em que ele próprio, invariavelmente, se mete. Neste sentido, tudo gira à sua volta e os outros não são mais do que meras personagens secundárias. Ora através da ameaça reiterada em criar um novo partido político ("não tenho planos para isso", afirma-o circunspecto), ora através das hostilidades pessoais ou das imperfeições ideológicas de que é muitas vezes acusado ("eu luto muito por ideias e por obras...", disse, seriamente), ora através da imagem que transparece para a opinião pública, contrária ao que ele gravemente proclama ("eu quando sucedi a Durão Barroso não pensei em mim", asseverou), ora ainda através da injustiça que foi a sua destituição do cargo de primeiro-ministro ("[Jorge Sampaio] resvalou para um terreno de oposição ao governo, logo desde a tomada de posse", acusa, ainda com mágoa, Santana), tudo serve para que o ex-primeiro-ministro se institua numa espécie de eterno menino guerreiro nacional, incompreendido e perseguido. Por isso, Santana Lopes não desiste, pois um dia o seu zénite chegará e, com ele, Portugal entrará numa nova etapa da sua gloriosa história. Mas, enquanto esse dia não chega, Santana Lopes não faz mais do que a sua auto-construção, o que passa, em muito, por desmentir muito do que é publicado a seu respeito na imprensa.
Como sabemos, uma dessas mistificações tem a ver com o seu (putativo) aprazimento pela chamada vida social. Nisto, o agora auto-proclamado (embora ele recuse esta terminologia) candidato à Câmara de Lisboa é peremptório: "eu não gosto da vida social. Odeio." Pelos vistos, a repórter sorriu, pois ele rapidamente retorquiu: "Pode rir-se à vontade. Ninguém acredita [ele não gosta que lhe chamem Calimero]. Mas detesto. Recuso tudo que posso." Diz mesmo que "não frequento sítios de desregramento de comportamentos". Ora, na mesma entrevista, algumas perguntas e respostas depois, já Santana, à questão astuciosa do jornalista, responde que "Sempre gostei de ir a uma discoteca. Ouvir música, dançar..." e que "gosto de ir ao sábado à noite jantar a um restaurante com amigos, depois podemos ir beber um copo". Mas ele avisa: "a maior parte das noites não saio." Só mesmo com sacrifício: "olhe, sábado tenho uma festa de anos. É uma festa com muita gente, enfim, tenho de ir. Mas por mim, não vou. Sei que a minha imagem é ao contrário, não há nada a fazer. Agora, se me perguntar: vai a recepções de embaixadas? Não, não vou." Continua o hilariante Santana Lopes: "Nesse dia fui a três cerimónias: essa, a entrega do prémio da Fundação Champalimaud e outra no Espaço Chiado. Era da sobrinha do rei de Espanha (...) Lançava um produto e convidou-me". Finalmente, a vertente social da entrevista com Santana Lopes a reconhecer que, quando era Primeiro-Ministro, entrou no bar Alcantâra-Mar (presume-se com a segurança toda atrás) para "dar um abraço a uma amiga minha que comemorava os seus 50 anos".
E é desta maneira que Santana Lopes jura a pés juntos que não é lá muito dado à vida social. É capaz de ter razão…

(publicado em A Voz de Trás-os-Montes, em 13/11/2008)

sábado, novembro 08, 2008

o bpn ou um refúgio dourado

A lista é interessante: Manuel Dias Loureiro, Rui Manchete, Amílcar Theias, Daniel Sanches, Arlindo de Carvalho, Miguel Cadilhe e o agora dado em parte incerta algures no Brasil José Oliveira e Costa. De comum, encontramos um fio condutor: todos eles foram políticos com responsabilidades governativas, desde Ministros de Estado (um deles - Dias Loureiro - tem, actualmente, lugar no Conselho de Estado) a Secretários de Estado. Não interessa muito, neste caso, a infeliz coincidência de estarem ligados ao PSD. Na verdade, estou propenso a crer que não se trata mais do que isso: uma infeliz coincidência, pois o PS (o outro partido do arco governamental em Portugal) é, neste âmbito, uma espécie de irmão siamês do partido de Cavaco Silva (ah!... é verdade: todos eles vêm dos anos áureos do cavaquismo...).
O que me interessa aqui focar, telegraficamente (penso que não podemos aprofundar muito estas coisas, visto que nem o alheado Vítor Constâncio consegue conhecer o que se encontra por debaixo da espuma noticiosa que alguma imprensa tenta, determinadamente, propagandear) diz respeito à inclinação de muitos grupos empresariais em contratar ex-ministros e secretários de estado para quadros muito bem remunerados das suas empresas. Qual a razão? Acaso eles fizeram obra que fosse motivo de orgulho pessoal e/ou nacional? Tirando um ou dois casos (que não se encontram claramente no BPN), os políticos que são contratados por estes grupos económicos só o são por mera questão de marketing. Neste sentido, muitos destes senhores serão invariavelmente apresentados como o sr. Dr. X, ex ministro disto e daquilo; o Sr. Y, ex-ministro de Cavaco Silva... e por aí adiante. Mas tudo isto acontece porque vivemos ainda no reino da parvónia, em que muitos deles têm como trunfo negocial o facto de terem jogado, um dia golfe com um qualquer presidente dos EUA (há para aí um que se gaba disto, penso que é Dias Loureiro). Mas o que é estranhamente verdade é que tudo isto, no mundo obscuro dos negócios da banca, conta. Como, aliás, se vê.

sexta-feira, novembro 07, 2008

o auto-julgamento de fátima felgueiras

Verdadeiramente curiosa foi a interpretação que Fátima Felgueiras fez da sentença que a condenou à perda do mandato e a três anos de pena suspensa. Para a autarca, o que se passou foi uma libertação (e não uma condenação, como ela própria realçou). Tudo isto resulta, obviamente, que Fátima Felgueiras esperava muito pior, pois quem sai do tribunal como ela saiu, aliviadíssima, é porque lá entrou com peso a mais... ou a menos.

quinta-feira, novembro 06, 2008

a manifestação de professores

No próximo sábado, vamos voltar a ver professores dos diversos ciclos de ensino - educadores de infância incluídos - empunharem, orgulhosa a dinamicamente, gritos de revolta contra a ministra, o ministro, os secretários de estado e tudo o mais que se mexa no Ministério da Educação. Vai ser, estou certo, uma - a segunda - mega-manifestação desta classe profissional. Aparecerão também os costumeiros sindicalistas envergonhados, convertidos e declarados. Tudo em nome dum ensino mais digno. Sábado à noite, depois de um dia bem passado nas ruas de Lisboa, já completamente desopilados de semanas de frustrações pedagógicas, os professores e educadores regressam às suas casinhas. Alguns sentar-se-ão, ainda nessa mesma noite, à sombra de um candeeiro a corrigir testes ou a preparar aulas. Outros descansarão, simplesmente. Mas o que se revela efectivamente certo é que na segunda feira de manhã, grande parte destes professores estarão nas suas escolas a negociar o processo de avaliação com o conselho executivo, ao mesmo tempo que, ainda com alguma exaltação da véspera, pronunciarão umas concludentes e orgulhosas palavras de ordem contra a ministra, o ministro e tudo o que se mexa no ministério da educação...

a vitória de obama

Será agora oportuno definir o seguinte: a vitória de Barak Obama é, efectivamente, um facto histórico extraordinário. Ainda ontem vi na televisão o filme Ray Charles e, ao olhos de um americano dos meados do século passado (e dos anos 60... ou 70... ou mesmo 80!...), pensar que um afro-americano poderia tornar-se presidente dos Estados Unidos seria um prognóstico no mínimo alucinante. Numa perspectiva sociológica, este arrombo na sociedade norte-americana será motivo, no âmbito das ciências sociais, para investigações futuras. Quanto ao plano político, parece-me óbvio que Barak Obama representa - mais a nível internacional do que propriamente interno - uma mudança de paradigma, o qual se alicerça numa postura mais dialogante e, consequentemente, menos prepotente e igualmente com uma menor fúria belicista. No entanto, não sou dos que entram em euforias desmedidas. Ele já deu sinais no mínimo estranhos, quando, por exemplo, referiu que matará Bin Laden, fazendo lembrar a paranóia bushiana quando afirmava, à cowboy, que queria Bin Laden, morto ou vivo. Mário Soares, a este propósito já lembrou, acertadamente: num estado de direito, não se pode afirmar uma coisa dessas: os criminosos têm direito a um julgamento. Mesmo Bin Laden! É provável que Obama tivesse proferido estas palavras num contexto de campanha eleitoral (ganhou, decerto, alguns milhares de votos mais conservadores com esta frase bombástica). É meu desejo que assim seja.
Um outro aspecto que gostaria de realçar diz respeito ao jargão jornalístico de que na América tudo é possível, referindo-se, precisamente, ao facto de um afro-americano ter sido eleito Presidente dos Estados Unidos. Por norma, os jornais começam este tipo de raciocínio realçando o percurso biográfico de Obama: pai emigrante, classe média, estudos, etc. Nesta contextura, não é só na América que "tudo é possível". A igualdade de oportunidades faz parte de qualquer país civilizado, tornando-se mesmo uma conquista dos mais elementares direitos humanos. Em Portugal, por exemplo, temos um presidente da República que, em miúdo, ajudou muito provavelmente, o pai na bomba de gasolina que este possuía algures em Boliqueime, no Algarve. E ainda bem que assim é. Acontece que a América estava mal habituada, com a omnipresença política de certas dinastias, desde os Keneddys, os Clintons e agora os Bush. Isso é que não era saudável.

terça-feira, novembro 04, 2008

bnp

É interessante vermos Miguel Cadilhe acusar o Banco de Portugal que falhou na fiscalização ao banco a que preside. E eu que pensava que uma das funções primeiras de um presidente de qualquer banco seria precisamente a da fiscalização do próprio banco!...

o vendedor de computadores

O que faz um primeiro-ministro, em plena cimeira Ibero-Americana, colocar-se numa posição de uma espécie de promotor comercial de uma empresa? Parece-me crível que a tomada de posição de José Sócrates, ao propagandear o computador Magalhães, não foi ingénua. Ele sabia que os partidos da oposição, com Louçã à cabeça (Manuela Ferreira Leite manteve um acostumado e - desta vez - sapiente silêncio) não deixariam passar esta sua excentricidade. E é precisamente este alarido que o primeiro-ministro, neste momento, mais precisa. Num momento em que os bancos portugueses (e europeus) estão à beira de um ataque de nervos, em que os professores se preparam para mais uma mega-manifestação, em que o fantasma do desemprego assoma a cada dia que passa e em que a taxa de crescimento para o próximo ano será, com sorte, de 0, 5%, o barulho em torno de um assunto colateral como é a apresentação aos seus colegas ibero-americanos de um computador “made in Portugal” (afinal, é ou não é português?...) favorece – e de que maneira! – a agenda política do governo. Para além disso, José Sócrates demonstrou, com esta atitude de vendedor, uma postura que os portugueses (principalmente aqueles que decidem eleições com o seu voto – o chamado “centrão”) gostam: um homem “sem peneiras” que não se importa de agarrar num computador e, com umas piadinhas à mistura, fazer uma pequena demonstração relativamente ao seu funcionamento.
No entanto, esta pantomina criada por Sócrates revela o que de pior ele, politicamente, circunscreve: a vacuidade do seu ideário político, ou melhor, a “nobreza” das suas convicções. Com efeito, nem mesmo aquelas frases soltas que tanto gosta de citar (“alguém disse que…”) o libertam das amarras desguarnecidas desta realidade. A presente crise económico-financeira serve como paradigma: passa de um neo-liberalismo encapotado em esquerda moderna (com que ganhou o partido), para uma esquerda que acusa esse mesmo neo-liberalismo de protagonizar um “capitalismo selvagem”. É o tempo em que vivemos, dirão alguns. É verdade. Mas convém não esquecer que são os Homens que devem estar à frente do tempo, modelando-o, e não o contrário.

(publicado em A Voz de Trás-os-Montes, em 06\11\2008)

sexta-feira, outubro 31, 2008

a crise e o autódromo de portimão

É inaugurado, este fim de semana, o autódromo do Algarve. O melhor do mundo, claro, como não podia deixar de ser. Retomando a sintomatologia da crise que abordei aqui, notamos que esta é essencialmente direccionada para alguns. É que os lugares mais caros - na ordem dos 40 mil euros por assinatura anual - encontram-se já praticamente esgotados. Os camarotes, pois claros.

terça-feira, outubro 28, 2008

o psd e o veto presidencial

O PSD anda naturalmente à deriva com esta celeuma que opõe o Presidente da República à maioria governativa. Por isso, o que de mais importante pode afirmar, a este respeito, é sublinhar que o PS anda a afrontar propositadamente o Presidente, tendo unicamente em vista intuitos eleitoralistas. Nada mais errado, como facilmente se compreende. O que interessa menos ao PS é um Cavaco Silva hostil. Quanto ao PSD, provavelmente gostaria que o Presidente fizesse por eles o papel que tão mal têm vindo a desempenhar, isto é, o de uma verdadeira oposição.

o veto de cavaco

Cavaco Silva vetou, desta vez, o Estatuto dos Açores. Estou de acordo com ele. De qualquer modo, o que aconteceu com a promulgação da lei do divórcio, carregada de críticas ao diploma por parte do Presidente, não favorece a imagem de imparcialidade tutelar do mais alto representante institucional da nação. É que tudo leva a crer que Cavaco Silva fez contas. E simples: 1+1=2. É muito! É demais!...

o melhor do mundo ou a imposição do melhor

Parece que, afinal, o qualificativo que vinha quase sempre atrás de Cristiano Ronaldo, através das banalidades que os comentadores desportivos amiudada e sofredoramente vêm pasmando nos ecrãs das televisões, ganhou, a partir de hoje, uma razão oficial de existência. Ou seja: Cristiano Ronaldo foi eleito o melhor jogador do mundo. A mim, simples mortal que nada entende da ciência futebolística, parece-me um exagero. Cristiano Ronaldo é um bom jogador mas não é nada de especial. Então como resolver isto de todos os anos eleger um melhor jogador do mundo? Simplex: não se elege. Eu explico: tal como o Barca Velha, que só o é quando merece, a eleição de melhor jogador de futebol do mundo deveria só acontecer quando realmente houvesse razão para tal. Se existisse essa cultura de exigência, estou certo que este tipo de concurso estaria suspenso desde... Maradona.

domingo, outubro 26, 2008

cavaco silva nos altos & baixos do expresso

Na secção Altos & Baixos do jornal Expresso aparece-nos Cavaco Silva num honroso segundo lugar positivo. E porquê? Tudo porque, segundo o jornalista João Garcia, fez bem o presidente não confundir "convicções morais"com "assuntos de Estado". Será que o jornalista leu com atenção a declaração de vencido de Cavaco Silva sobre a Lei do Divórcio por ele promulgada? Não me parece. É que nas palavras de Cavaco, não existe sombra alguma - como, aliás, deve ser - de posições pessoais de índole moralistas.

sexta-feira, outubro 24, 2008

a crise e os relógios

A julgar pela quantidade de relógios de luxo publicitados na revista Visão desta semana (dez anúncios), acredito, definitivamente, que a crise é, afinal, só para alguns.

os bancos e os 20 mil milhões

Ouvi, há pouquíssimas semanas, no programa Prós e Contras da RTP, os responsáveis maiores dos bancos portugueses mais representativos (BPI, BES, Millennium e CGD). Todos eles respiravam confiança. Ou porque um deles é o maior investidor em Angola, ou porque outro é o maior no crédito habitação, ou por isto... ou por aquilo... Só caganças, portanto. Ora, hoje os mesmos responsáveis (BPI, BES e Milllennium BCP) já admitem, timidamente, recorrer ao bolo que o Governo lhes disponibilizou. Tudo porque os lucros a que estavam habituados (na ordem das centenas de milhões de euros por semestre) não estão a ser realizados. O BPI, por exemplo, já declarou ter registado até Setembro um lucro de 34,4 milhões de euros, pior do que o esperado pelos especialistas. Estes mesmos especialistas afirmam que o facto de se ter passado das centenas para as dezenas de milhões de euros se deve, em grande parte, à comparticipação financeira do rival Millennium no banco, o que quer dizer que os proveitos deste banco terão também uma redução considerável. A par disto, estou propenso a crer que umas fatiazitas dos vinte mil milhões servirão para o pagamento de certos ordenados, os quais, provavelmente, continuarão imunes à crise.

quarta-feira, outubro 22, 2008

a promulgação

O que impressiona na promulgação da lei do Divórcio, é que Cavaco Silva ainda não disse por que razão a promulgou. Até agora só temos ouvido, por parte do chefe de estado, apreciações como "as dificuldades interpretativas do diploma", "a desprotecção da mulher e dos filhos menores" que o mesmo potencia, a "visão contabilística do casamento", etc. Acrescenta ainda, de forma verdadeiramente extraordinária, que as suas dúvidas, impostas pela sua "consciência e lealdade institucional" (!), não se alicerçam em "qualquer concepção ideológica sobre o casamento, mas apenas a necessidade de proteger a parte mais fraca nos contextos matrimonial e pós-matrimonial, de acordo com uma análise realista da vida familiar e conjugal no nosso país".
Vamos lá ver se percebi: o presidente levanta dúvidas para proteger a parte mais fraca? Mas não seria mais óbvio que essa protecção passasse pela não promulgação do documento?!...

terça-feira, outubro 21, 2008

a força da maioria e a fraqueza do presidente

Se existe um exemplo prático do poder do Presidente da República (ou do chamado simbolismo do cargo) podemos objectivamente encontrá-lo na recente promulgação da Lei do Divórcio. Como se sabe, Cavaco vetou a proposta de lei do Governo. De volta ao Parlamento, o documento manteve-se praticamente inalterado. Agora, o Presidente da República não teve outro remédio senão assinar por baixo, mantendo, apesar de tudo, as suas críticas iniciais, ou até mesmo aprofundando-as.
Extraordinárias são também as declarações dos partidos. Todos eles zurzem em Cavaco. Da esquerda oposicionista, o tom acusatório vai ao encontro de uma vertente ideológica que, afinal, ainda existe, remetendo Cavaco Silva para uma visão social demasiado conservadora. O PS, através do líder da sua bancada parlamentar, Alberto Martins, limita-se a afirmar, numa espécie de grau zero do discurso político, que o Presidente prestou um bom serviço ao país. Mas é, a meu ver, do PSD que as críticas atingem uma maior mordacidade sibilina. Atente-se: pela voz do vice-presidente da bancada parlamentar, António Montalvão Machado, o partido sublinha que "O PSD compreende a posição do Presidente da República" (apesar de considerar uma "lei lamentável") e que "em termos formais, o Presidente da República poderia vetar, mas o bom senso não aconselharia a isso, depois de uma maioria na Assembleia da República insistir na mesma filosofia".
Ora, não sei se Cavaco Silva gostou deste "apoio" por parte do maior partido da oposição. Estou em crer que não. É que o PSD não fez mais do que passar um atestado de menoridade política não a Cavaco Silva, mas ao Presidente da República.

(publicado no jornal Público em 23/10/2008)

segunda-feira, outubro 20, 2008

as eleições dos açores e a hipocrisia política

Nada como os resultados de eleições para verificarmos a hipocrisia que paira nos partidos políticos na hora de assumir não só as vitórias mas também as derrotas. De facto, desde há muito que nos habituámos a olhar para o PCP (ou CDU, a vestimenta eleitoral dos comunistas), como o partido que conseguia transformar os seus sucessivos e dramáticos esvaziamentos eleitorais em tímidas vitórias, ou mesmo em retumbantes vitórias "dos trabalhadores" contra "a direita reaccionária". No entanto, a arte da transfiguração numérica, resultante dos votos expressos nas urnas em dia de eleições, tem vindo a ser cultivado pelas diversas forças partidárias. Serve para exemplo as eleições açorianas.
Carlos César, reeleito para um mandato de quatro anos à frente da região autónoma, enfatizou a mudança do paradigma democrático na ilha, ao lembrar que os Açores deram uma lição de democracia ao alargar para cinco os partidos oposicionistas com assento nas bancadas da Assembleia Regional. Tudo, claro, para não memorar as perdas de um deputado e de cerca de 15 mil votos.
No lado do PSD, o rodopio semântico foi, de igual modo, interessante e risível. Assim, Costa Neves, que nada de relevante trouxe para a discussão política nesta campanha eleitoral, disse que se demitia por causa da abstenção. O alcance do pensamento é de tal modo profundo que, seguindo os restantes líderes partidários esta extraordinária orientação programática, não havia, nos Açores (nem em mais lado nenhum do mundo ocidental, suponho) sinergias suficientes para formar um qualquer governo. Mas a líder nacional do seu partido também não lhe ficou atrás no depauperamento discursivo. Na verdade, Manuela Ferreira Leite, na ânsia de escapar à inevitável "leitura nacional" proposta pelos jornalistas e comentadores, não arranjou melhor exemplo do que invocar os trinta e tal anos de governo jardinista na Madeira. De facto, depois do previsível assentimento de Santana Lopes para a disputa eleitoral à Câmara de Lisboa, é caso para afirmar que Manuela Ferreira Leite é, neste momento, uma líder sem rumo, esperando lá para Junho ou Julho uma derrota honrosa nas legislativas (arrebatar a maioria absoluta ao PS, por exemplo) para, descomplexadamente, sair da nau que tem vindo a comandar de forma desastrosa.
Por outro lado, José Sócrates, ao desenhar uma leitura nacional nestas eleições, provou que, de facto, tudo é, na sua cabeça, (muito) relativo, como, aliás, (também) comprovámos no último debate parlamentar, no qual criticou a arquitectura económica financeira em que assenta o ultra-liberalismo que, actualmente, (ainda) nos rege, como se não fizesse parte integrante e apologética dessa mesma vertente (vertigem, ia escrever) socio-económica. Espantosamente, a crise serve também, no caso de José Sócrates, para fazer tábua rasa de grande parte do que tem sido desenvolvido e aceite como um verdadeiro paradigma governativo à escala mundial.

(publicado na Voz de Trás-os-Montes em 23/10/2008)

quinta-feira, outubro 16, 2008

os empatas

Empatámos contra a selecção da Malta (desculpem, Albânia). De imediato, apareceram os "experts" do costume, aqueles que comentam os jogos da maneira mais científica possível (a emotividade/espontaneidade de Sclolari versus a cientificidade de Queirós... andei a ouvir isto na rádio o dia todo!...). São, simplesmente, incautas as opiniões de praticamente toda a gente que opina sobre futebol. Aliás, esta gente que é remunerada (presumo que desafogadamente) não faz mais do que reflectir o povão, isto é, aqueles indivíduos que ora gritariam efusivamente se Portugal tivesse marcado um golo, reiterando a a nossa predistinação para altos voos futebolísticos, ora despachariam, enraivecidos, o treinador e os cristianos da equipa "de todos nós" (bela expressão), na eventualidade de Portugal perder (ou empatar), por exemplo, o próximo jogo contra a Suécia (neste âmbito, os responsáveis pela Federação - e clubes - agem do mesmo modo, como se passa com as famosas declarações, depois destes jogos frustrantes, que está tudo bem com o treinador, e que este merece toda a confiança, etc. etc. etc.).
Acontece que Portugal está, no futebol, a atravessar o fim de um (bom) ciclo. A diferença é que outras equipas que percorreram, do mesmo modo, momentos áureos, conseguiram, ao contrário do que sucedeu connosco, ganhar alguma coisa: um campeonato da Europa ou do mundo ou até - na pior das hipóteses - não terem ganho nada mas terem deslumbrado. Com Portugal nada disso aconteceu: nem ganhou, nem verdadeiramente deslumbrou.

a acção de formação sobre o magalhães

Vi na televisão alguns professores numa acção de formação sobre o computador Magalhães. Cantavam a "Grândola Vila Morena" e outras melodias. Não entendo o embaraço que a reportagem televisiva tentou edificar relativamente aos professores que a frequentavam. Eu vi um grupo de professores bem dispostos a cantarolar e a remar. Aliás, são as ciências da educação no seu esplendor. Não se queixem...

o candidato santana e pacheco pereira

Pacheco Pereira diz que entende o processo que desencadeou a candidatura de Santana Lopes à Câmara de Lisboa. Reflecte o comentador que tudo isto é já muito dejá vu, pois já acontecera com Luís Filipe Menezes, quando este teve de aceitar o ex-primeiro ministro como líder da bancada social-democrata. Ora, este raciocínio de Pacheco Pereira é fantástico porque, duma assentada, equipara Menezes com Manuela, pelo menos no que diz respeito à esfera da autoridade. Deste modo, ficamos a saber que Menezes teve que levar com Santana e que Manuela não tem outro remédio senão levar com Santana. No meio de tudo isto, é o próprio Santana que se deleita com todo este festival. Mas todos nós sabemos que ele não se importa nada.

terça-feira, outubro 14, 2008

o zeloso inspector do fisco

Ouvi há pouco um inspector do fisco e fiquei apreensivo. Dirigindo-se indirectamente ao ministro das finanças (falava para uma jornalista), disse qualquer coisa como isso: o sr. ministro pode ficar tranquilo porque nós não descansamos enquanto não atingirmos os nossos objectivos, trabalhando, se necessário, aos sábados e domingos. Ah! Antes sublinhou que os trabalhadores do fisco são um "corpo de elite" (!).
Ora, para além da figurinha cómica do senhor (apesar de possuir um semblante seríssimo como, aliás, convém, aos corpos de elite...), o que estas declarações, perante as câmeras da imprensa, também revelam diz respeito à atmosfera que actualmente se vive em toda a função pública e, neste caso particular, na administração fiscal. De facto, esta cultura da meritocracia dá nisto: uns bajuladorzecos que não têm sequer a pudícia (profissional, pessoal) necessária de fazer, publicamente, declarações deste tipo.

segunda-feira, outubro 13, 2008

a crise

Não se ouve, por parte dos ministros das finanças ou dos primeiros-ministros dos diferentes países europeus, uma palavra que oriente o sistema capitalista - o que precisamente originou esta paisagem cadavérica e que já se alastrou para a economia - para a mudança. Pelo contrário, o que as sucessivas e quase alucinantes reuniões (que se desenrolam a um ritmo verdadeiramente vertiginoso) evocam resume-se, basicamente, a um apoio unidireccional à banca, na esperança que esta consiga, finalmente, sair duma falência irrevogável. Quanto à ética, à moral que devem reger o capitalismo financeiro, nem uma palavra. É certo que as crises parecem cíclicas, mas também é certo que, agora, o cíclico económico deixou de o ser, originando uma continuidade que, naturalmente, há de chegar a um fim.

domingo, outubro 12, 2008

A erc e as televisões

Antigamente, chamava-se Alta Autoridade para a Comunicação Social, sem dúvida um nome pomposo; agora, mais modesto, denomina-se Entidade Reguladora da Comunicação Social (ERC). Os portugueses em geral, nos quais eu me incluo, não davam pela existência de tão nobre e útil entidade, não fora algumas fugazes aparições noticiosas envolvendo, invariavelmente, os responsáveis da instituição. A última diz respeito ao chamado "dossiê Sócrates", em que o primeiro-ministro aparece como autor de uma frase, considerada - e bem! - como uma forma de pressão ilegítima sobre o livre e democrático funcionamento dum jornal, neste caso específico, o Público. Sócrates teria proferido, assim, seca e atabalhoadamente, digna de um filme de "mafiosos convictos" de classe B, a seguinte frase ao director do jornal, José Manuel Fernandes: "Fiquei com uma boa relação com o seu accionista [Paulo Azevedo, presidente do grupo Sonae, proprietário do periódico] e vamos ver se isso não se altera". Ora, conforme posteriormente se veio provar, nem o director do Público relatou esta extraordinária frase aos inquiridores da ERC, nem o primeiro-ministro a pronunciou. Tudo não passou de um lamentável erro, "de uma troca", segundo disse a Entidade Reguladora. Mais: Azeredo Lopes, que é o presidente da coisa, foi espevito a apontar o dedo arguidor a um pobre funcionário, que se "esqueceu de gravar o depoimento" de José Manuel Fernandes. Tudo isto está, obviamente, mal contado. E o que torna também esta miscelânea interessante é o facto de nenhum partido com assento parlamentar não ter exigido um célere e sério processo de investigação em torno do que, de facto, aconteceu. Limitaram-se a lamentar o sucedido, como aliás, fez, Azeredo Lopes.
Ora, o que eu verdadeiramente penso, não a respeito desta trapalhada, mas antes a respeito da ERC, é que ela não serve para nada. De facto, se tivermos em consideração que o objectivo primeiro da instituição é a "regulação e supervisão de todas as entidades que prossigam actividades de comunicação social em Portugal", não é difícil chegar à conclusão que a ERC é um vazio desalentado na regulação das "actividades de comunicação". Basta perdermos dois ou três dias e analisar as televisões. Na verdade, medidas tão simples como as regulações da publicidade entre os filmes (é praticamente impossível ver um filme numa das três televisões de canal aberto, em Portugal), das grelhas muitas vezes descabidas dos telejornais (quando abrem, por exemplo, com os 150 milhões de euros do Cristiano Ronaldo, deixando quase como nota de rodapé, um atentado no Iraque que causou dezenas de mortos) e/ou as durações demasiado excessivas dos mesmos, com publicidade (muitas das vezes desesperantemente longas) em simultâneo nos três canais, contribuiria para que se fundamentasse o propósito fundador da Entidade Reguladora para a Comunicação Social. Até porque estas medidas não faziam mais do que obrigar as televisões a respeitar, antes de tudo, o consumidor, isto é, o público. Mantendo-se o caos televisivo, um simples agendamento de um qualquer programa, um filme, por exemplo, revela-se uma tarefa impossível em qualquer lar do país. A não ser que se tenha acesso aos canais por cabo.

a raça

Mais um contributo de Cavaco Silva, desta vez em Aljubarrota, para a evocação da "raça portuguesa": "soubemos vencer. É com esse espírito que temos de enfrentar as adversidades da hora presente". No ano de 1139, em Ourique, foi, segundo diz a lenda, a ajuda divina que fez com que Afonso Henriques se tornasse, efectivamente, rei de Portugal. Só espero que o nosso presidente, aquando de uma inauguração qualquer para essas bandas, não se lembre de evocar a predestinação (sacrossanta) de Portugal.

sábado, outubro 11, 2008

a crise e os culpados

Ainda em relação ao post anterior, eu não defendo a liberalização total dos mercados, como pode parecer, quando afirmo que se deve deixar afundar quem tem de se afundar (salvaguardando, naturalmente, os trabalhadores, principalmente aqueles que não têm culpa no cartório). Isso é conversa para o Pedro Passos Coelho e o António Borges do PSD, os quais ainda não perceberam que esta coisa da economia (que no entender deles é igual a mercado) à frente da política só pode resultar naquilo que se está vendo. O que eu singelamente proponho é que se imputem as culpas aos verdadeiros responsáveis. E estes, felizmente, não se escondem (honra lhes seja feita), como se verifica nas celebrações de desagravo que por essa Europa fora têm vindo a ser efectuadas. A última teve lugar num dos melhores restaurantes do Mónaco (o restaurante do Hotel Paris-Monte Carlo, o Louis XV) e teve a cargo dos executivos da divisão de seguros do banco Fortis. Parece que a jantarada custou mais ou menos 150 mil euros.

sexta-feira, outubro 10, 2008

a crise e os planos

Pelo andar da carruagem, não há planos salvíficos que orientem o mercado financeiro para o paraíso ou, na melhor das hipóteses, na direcção da retoma, seja lá o que isso verdadeiramente for. Daí que o meu humilde conselho se baseie no seguinte: ou nacionalizam tudo ou deixam afundar quem tem de se afundar. Afinal, sabemos todos quem são os culpados. Agora andar a esmolar aqui e ali, recebendo milhares de milhões de euros (a nacionalização dos prejuízos que falava Mário Soares) para ver se a coisa se endireita não é, a meu ver, solução para nada. É que estas pessoas da alta finança não conseguem aprender, como se viu com a ajuda que a seguradora AIG recebeu. Com efeito, os executivos da empresa resolveram comemorar a fuga à falência com um fim-de-semana de luxo (spa's, resort's, etc.) no qual gastaram qualquer coisa como 440 mil dólares. É sempre bom que a orquestra continue a tocar, pensarão alguns.

a crise e as opções do governo

Afinal, ao contrário que o Governo advoga, a crise financeira e económica origina alguns adiamentos programáticos. É o caso, por exemplo, da 4º fase da privatização da GALP. No entanto, quando o que está em cima da mesa são as obras públicas, o discurso é visto por outro prisma, isto é, o da campanha eleitoral do próximo ano.

quarta-feira, outubro 08, 2008

acabou o tempo da prosperidade

Não posso deixar de sublinhar a melhor intervenção de hoje no Parlamento e que teve a cargo de Jerónimo de Sousa. Tudo a propósito das infelizes e decorrentes (decorrentes na infelicidade) declarações de Manuel Pinho, que é ministro da economia de Portugal. Manuel Pinho, reflectido, afirmou há dias que o tempo da prosperidade acabou. Já ouvimos muitas variantes frásicas do verbo acabar, desde Santana Lopes (a crise acabou) até ao próprio Sócrates (a crise acabou, ou a brincadeira acabou, referindo-se à educação...). Mas o que nunca tínhamos ouvido foi este arrastamento do pobre verbo para uma dupla negação, isto é, o tempo da prosperidade deixou de existir. Mas o que disse Jerónimo de Sousa? Apenas se interrogou: mas a prosperidade acabou para quem? Quem é que, ao longo destes anos prosperou? Sócrates, o visado, não respondeu.

(publicado no jornal Público em 11/10/2008)

a avaliação de desempenho e os professores

Recomeçou, timidamente, por parte dos sindicatos e ainda mais por parte dos professores, a contestação à avaliação de desempenho. Escrevo "timidamente" como forma de aligeirar um qualificativo que seria, incontornavelmente mais desprezível para esta classe profissional - a dos professores - que se entreteve, no final do outro ano, numa manifestação deveras interessante, em Lisboa, na qual participaram mais de cem mil professores - praticamente toda a classe profissional. O interesse da manifestação resume-se - e não é pouco - a uma perspectiva sociológica e profissional, que, estou certo, contribuirá para um aprofundamento dos estudos nas ciências sociais, designadamente no que diz respeito aos parâmetros socio-profissionais no sector educativo. Neste sentido, poderia formular-se a seguinte questão: o que faz com que a manifestação que englobou praticamente 100% dos professores não tenha resultado numa conquista igualmente plena dos seus objectivos? Daí que agora, o Secretário de Estado da Educação Walter Lemos (que raramente diz alguma coisa de jeito) se debruce, enfatuado e irónico, sobre as ténues contestações outonais dos sindicatos. Como ele próprio referiu, a respeito duma eventual contestação dos sindicatos, "estamos em Outubro, penso que diz tudo". Pois é, cada um tem (o secretário de estado) que merece.

o mundial de futebol

Numa breve entrevista inserida na última página do DN, diz o inefável Madaíl, presidente da Federação Portuguesa de Futebol: "Mundial não é prioridade mas era muito bom". Ficamos também a saber, por parte deste senhor, que "sabemos da disponibilidade no nosso Governo para a realização do Campeonato do Mundo em 2018" e que "isto [campeonato do mundo de futebol] não é nenhuma prioridade nacional".
Pela minha parte, agradeço ao sr. Madaíl esta preciosa informação relativamente aos intentos do Governo da República nesta matéria. Eu não sabia. Possivelmente, nem o Presidente da República saberá. Mas isso também não será importante, segundo a óptica de Madaíl, pois sublinha, desassombrado, que "ele [Cavaco Silva] também já tinha a mesma opinião [contrária] no Campeonato da Europa de 2004" e que, "como é o nosso Presidente da República, temos de respeitar". Nem mais. Temos de respeitar. Gostava de ouvir a opinião do seu parceiro Laurentino Dias, apesar de não ser difícil adivinhar qual seja.

terça-feira, outubro 07, 2008

o dinheiro ofertado aos bancos e a fome

Não sei se é demagogia, mas um dos mais transparentes raciocínios que li sobre a crise que todos os dias se alastra nas nossas vidas mas, principalmente, nas vidas daqueles que andaram durante estes anos, numa espécie de rodopio infantilizado, montados em lucros rapidamente esfumados porque eram alicerçados, no fundo, numa boa dose de fantasia, um dos mais transparentes raciocínios, dizia, pertence (sem, no entanto, ter a certeza da autoria) ao líder do Parlamento Europeu. Disse mais ou menos isto: se há dinheiro para ajudar esta gente, então também deve haver para radicar a fome no mundo. Certeiro e simples, ou simples e certeiro.

sexta-feira, outubro 03, 2008

um certo capitalismo

Uma notícia da manhã informativa: o banco de investimento suíço UBS, em crise financeira decorrente do actual estado da economia planetária, com epicentro nos Estados Unidos da América, despediu mais de dois mil funcionários. Como consequência (inevitável?) desse meticuloso e reflexivo acto de gestão empresarial, as acções do banco retomaram uma subida que havia sido interrompida.
E é assim o mundo económico-financeiro em que vivemos. O económico (é a economia, estúpido...) e, por arrastamento, todos os outros.

quinta-feira, outubro 02, 2008

ainda o casamento

Ouvi agora os respectivos líderes parlamentares do PS e do PSD. Aquele afirma, extraordinariamente que o ex-líder da JS é o único deputado com liberdade de voto, visto ter sido uma bandeira de há muito dos jovens socialistas. Acrescenta ainda, desavergonhadamente, que esta excepção simboliza o grau de liberdade que se vive no interior do partido. É, sem dúvida, um bom ponto de partida para qualquer humorista explorar. Quanto ao líder parlamentar do PSD sublinha a liberdade de voto, sem no entanto deixar de referir a cartilha ultra-conservadora de Manuela Ferreira Leite que se resume àquela ideia tosca da procriação como o principal fito do casamento. Ora, tendo em conta esta posição, deveria o PSD seguir o PS na obrigatoriedade do "não". Por outro lado, o PS, nesta sua lógica de liberdade interna que fala Alberto Martins, só poderia, naturalmente, ingressar no "sim".

o ps e o psd e o casamento gay

Sabemos que isto já não é, politicamente, o que era. Sabemos também que existe um efectivo esbatimento de uma certa ideologia tradicionalmente colada a diferentes facções partidárias. No entanto, nunca esperei ver o PS a acusar uma obrigatoriedade de voto contra o casamento homossexual e o PSD de Manuela Ferreira Leite a dar liberdade de voto aos seus deputados. É, por um lado, o partido do governo a pescar votos à direita; por outro, o partido da oposição, a intrometer-se (imagino com que esforço de consciência para Manuela Ferreira Leite) em orientações tradicionalmente fixadas à sua esquerda. Pois, mas a tradição já não é o que era. Principalmente quando as eleições espreitam.

os professores

Há tempos, numa conversa rápida e perdida com um professor, este referiu, crítica e ironicamente, o seguinte: "repara, são estes cento e tal mil professores que há três ou quatro meses andaram com bandeirinhas em Lisboa a gritar palavras de ordem contra a avaliação e agora é vê-los, cordeirinhos e preocupados, à volta destas daquelas grelhas, destes e daqueles objectivos..." Eu, incrédulo mas convencido, não pude deixar de lhe dar razão. Na verdade, toda a pantomina exposta por esta classe profissional em Lisboa não passou de um mero adereço protestativo, inócuo e ilusório.

a greve e o fracasso do secretário de estado

Anda para aí um secretário de estado que pensa que repetindo a mesma palavra umas sete ou oito vezes em mais ou menos 30 segundos, consegue fazer com que as pessoas que o ouvem (que circulam, por exemplo, no carro, como foi o meu caso), e/ou que o vêem em casa à hora do telejornal, entre uma ou duas colheradas de sopa, considerem que a verdade, de incisivamente repetida, só pode estar do lado deste mestre da comunicação. Ora, comigo foi precisamente o contrário: pensava que a greve geral convocada pela CGTP não estava com a repercussão social desejada pela central sindical, mas... após ouvir aquele senhor que é secretário de estado repetir a palavra "fracasso" uma mão cheia de vezes, numa nesga temporal própria deste tipo de comunicações, dei comigo a pensar que, afinal, os 11% do governo deveriam ter sido um pouco mais.

domingo, setembro 28, 2008

supostos furos jornalísticos

Eu sei que Alberto Martins, quando abre a boca politicamente, fá-lo, normativamente, de forma evasiva e pouco clara a entendimentos directos, o que resulta, na maior parte da vezes, numa inocuidade de sentido verdadeiramente perversa. "É um político", dirão alguns, resignados com este tipo de procedimento, habituados a escutar o acostumado e oportuno laconismo desta classe profissional nas diversas comunicações ao povo português, seja através de conferências de imprensa, seja no Parlamento ou mesmo (principalmente) em entrevistas de maior ou menor extensão.
Todavia, retirar da entrevista que o líder da bancada parlamentar do Partido Socialista concedeu ao programa Diga lá Excelência (Rádio Renascença e Público) uma espécie de furo jornalístico que a imprensa titula de alterações políticas (com maior ou menor grau de variabilidade enfática) entre Cavaco Silva e a maioria socialista é um passo que só um jornalismo pouco sério consegue empreender. É que as alterações políticas resumem-se, tão somente, a dois vetos presidenciais, de manifesta importância, os quais têm que ver com variantes marcadamente (in)constitucionais e de correlação entre diversos órgãos de soberania (Estatuto dos Açores) e também com outro tipo de agendamento político - este de feição mais social (embora de importância constitucional igualmente relevante) - que é a Lei do Divórcio, cujo delineamento preconiza mudanças que, não sendo radicais, implementariam um novo paradigma nas relações matrimoniais que avistam, na sua forma litigiosa, o seu término.
Na verdade, o que Alberto Martins reflectiu na entrevista foi que a relação constitucional funciona de "forma harmónica, equilibrada" e que houve divergências políticas entre Governo e Presidência a respeito destes dois casos. Ora, cada veto presidencial corresponde, naturalmente, a uma divergência política. Daí que se chame veto, isto é, proibição, recusa, suspensão (de uma lei) e que o mesmo seja uma prerrogativa constitucional do Presidente da República enquanto órgão de soberania último da autonomia nacional, que jurou cumprir e fazer cumprir a Constituição da República. Assim, se nos orientarmos por este tipo de sofreguidão jornalística, nomeadamente no que aos títulos da imprensa escrita e abertura de telejornais diz respeito, não fazíamos mais nada do que analisar, de forma deprimente, as "alterações políticas" entre as duas maiorias eleitas pelo povo português. É que Cavaco Silva já utilizou a arma da não promulgação e devolução dos diplomas ao Parlamento (o veto político) noutras questões socialmente relevantes. Só em Agosto do ano passado, Cavaco vetou por três vezes igual número de diplomas governamentais: a lei orgânica da GNR, o estatuto dos jornalistas e o diploma sobre a responsabilidade civil extracontratual do Estado. Não se falou, na altura, de alterações institucionais "delicadas" entre governo e presidência. No entanto, a pouco mais de meio ano de eleições legislativas, autárquicas e europeias, tudo serve para perscrutar sinais de divergências. Tudo isto não passaria de relevâncias fugazes se não se iniciasse, a partir de agora e até Junho ou Julho, um acompanhamento delirante de todas as mensagens políticas originárias de ambas as partes. Infelizmente ou não (os jornalistas encontram-se, sem sombra de dúvida, nesta última hipótese), não falta ao governo porta-vozes do disparate. Pelo outro lado - o lado presidencial - a companhia também não é famosa, se tivermos em conta as vozes que se alevantam sistematicamente de forma contraditória, em que Manuela Ferreira Leite, no seu perfil cavaquista, se empenha em não criar ondas de choque com o seu presidente. Resta-nos a nossa própria capacidade de discernir o que é ou não relevante na mensagem política sabendo que, muitas vezes, políticos e jornalistas andam, ardilosamente, de braço dado.

sábado, setembro 27, 2008

as casas da sorte em lisboa

Parece-me evidente que a recente polémica da atribuição de casas (pertencentes à Câmara Municipal de Lisboa) a tudo quanto é cunha está para durar. Pelo que leio, pelo menos desde há 20 anos existe uma espécie de tradição, a qual se resume à distribuição de casas inseridas no estranhamente chamado "Património Disperso" da autarquia. Estas habitações, que vão desde palácios (?!), vivendas (!), apartamentos, lojas e armazéns, estavam, no que às habitações diz respeito, destinadas a motoristas, directores e outros empregados da Câmara. A média da renda mensal é de 35 euros. Sendo um esquema assim tão simples, ainda para mais à luz da lei, não é de estranhar que estas abençoadas regalias ultrapassassem, em muito, o fim para que estavam destinadas e passassem a abranger uma espécie de hereditariedade auto-proclamada por quem usufruía das casas. Para além disso, não entendo como é que, por exemplo, um indivíduo que desempenha o decerto estimulante cargo de Director do Departamento de Apoio aos Órgãos Municipais necessita deste estímulo camarário. Possivelmente, o senhor director até vive numa outra casa em Lisboa, não necessitando da que lhe foi ofertada através duma módica quantia mensal. Por isso, como a renda é tão simbólica para os seus bolsos, e como tem um filhote em idade emancipadora, nada mais natural que atribuir a casa que lhe foi atribuída ao seu já crescido rebento. Isto e outras particularidades afins, duram há décadas, em Lisboa.
Mas como os estudos e as investigações encaixam bem nestas coisas, Manuel Damásio, professor da Universidade Lusófona, efectuou um "levantamento exaustivo (Expresso) do património disperso da Câmara Municipal de Lisboa. A conclusão não podia ser mais cómico-trágica: a Câmara não sabe do que é dona.
Perante isto, será legítimo apontar acusatoriamente o dedo a alguém? Provavelmente sim. Vamos ver.

a aparição de Sarah Palin numa cerimónia religiosa

É por estas coisas que os media e alguns comentadores encartados se pelam. Anda a circular no espaço internauta um vídeo em que se vê a candidata a vice-presidente dos EUA numa cerimónia religiosa. Ao que parece, o momento religioso é muito específico: uma espécie de exorcização fantasmagórica em que a comunidade cristã do Pentecostes é fértil. A minha questão, neste âmbito crítico, é simples: qual o problema? Por acaso alguém se revolta quando vemos ritualizações de outros cultos (por exemplo, da igreja católica)? Isto de olharmos umbilicalmente nunca fez bem a ninguém. Se a senhora Palin, no direito que lhe assiste de praticar um determinado culto religioso, se depara com um qualquer e significativo ritual, o que tem a fazer é cumpri-lo, se eventualmente essa ritualização lhe espairecer a alma. É que nestas coisas de Pai, Filho e Espírito Santo não pode haver uns melhores que outros.

quinta-feira, setembro 25, 2008

mudar de vida, segundo marques mendes

Não sei se Marques Mendes, o ex e efémero líder do PSD, mudou de vida. Provavelmente sim. O que eu sei é que nada como sair da política para se ser ouvido e respeitado... politicamente. Mesmo que esse regresso esteja nebulosamente imbuído de banalidades como quando afirmou, na apresentação do livro repleta de "altas" personalidades, que "o debate político em Portugal é bastante pobre, é muito táctico, muito conjuntural, muito imediatista". Como é que Marques Mendes, num ano de retiro empresarial, aprendeu tanto?

o casamento homossexual

Desde que Manuela Ferreira Leite discorreu sobre a sua teoria na qual afirma que todo o casamento visa a procriação, este tema (com as suas variantes) tem se tornado um ponto de discussão incontornável. Daí que, em volta do casamento entre pessoas do mesmo sexo se tenha ouvido, por parte de todos os partidos, com a esperada excepção do Bloco de Esquerda, as mais variadas orientações. Uma delas é a aceitação do pressuposto matrimonial, mas sem a possibilidade do casal adoptar uma criança. No entanto, parece-me evidente que este juízo carece de bom senso, senão mesmo de constitucionalidade. É que todo o casal tem o direito da adopção. Daí que não podemos ser modernos (seja lá o que isso represente) para aceitarmos que dois homens ou duas mulheres jurem, sob a alçada da lei matrimonial, amarem-se para sempre e, por outro lado, retirar uma dos mais nobres direitos que a própria lei confere a um casal: a educação de uma criança.

quarta-feira, setembro 24, 2008

o motivo afectivo de sócrates

Ficámos a saber que a cidade de Guimarães foi escolhida para a "reentrée" política do PS por motivos afectivos relacionados com o primeiro-ministro, visto que foi pelo círculo de Braga que foi eleito, pela primeira vez, deputado. Nada de relevante a dizer sobre este facto se tal não implicasse uma linha apoteótica de deificação do líder e, consequentemente, a construção paulatina de um apaziguamento partidário.

terça-feira, setembro 23, 2008

o discurso de josé sócrates em guimarães

Muito se falou do discurso que marcou a “reentré” política do Partido Socialista, em Guimarães, e que teve como principal figura José Sócrates. Eu disse principal figura? Na verdade, o primeiro-ministro lembrou-se de levar para o púlpito socialista (onde milhares de pessoas, vindas de autocarro de todo o país, aguardavam, ansiosamente, a mensagem ministerial) a Ministra da Educação, Maria de Lurdes Rodrigues, como símbolo maior destes quase quatro anos de governação maioritária. Para mim, foi este o facto de maior relevância no assomo socrático. O resto, foi um enchimento retórico, sem qualidade conteudística de alguma espécie, destinada a um bater de palmas quase programado, seguido, aqui e além, de uns ululantes e estridentes assobios.
À direita e à esquerda, Sócrates não deixou de espicaçar os adversários, com particular destaque para as questões sociais, designadamente o PSD que, com a sua tendência genética (ainda mais) liberal, poderá colocar em causa uma vitória nas próximas eleições. Daí as frases, venenosas: “queremos uma segurança social pública. É aqui que está a fronteira entre a esquerda e a direita, uma diferença social”! E quanto aos partidos de esquerda, que acusam José Sócrates de conduzir o país precisamente através da cartilha neoliberal (o que cola, inevitavelmente, o PS ao PSD), o orador não perdeu muito tempo, tudo em nome da modernidade, isto é, da esquerda moderna com que saiu vitorioso em 2005.
Só que foi muito mal aconselhado quando lhe disseram que a melhor companhia ministerial que podia ter em palco era Maria de Lurdes Rodrigues. Porquê? Tão simples quanto isso: a ministra da Educação espelha o que de pior tem vindo a ser feito, ao longo destes anos, na área educativa (sinceramente, pensava que tal não fosse possível). Mais: falando de uma esquerda social, José Sócrates levou para Guimarães uma ministra que tem demonstrado um longo e horripilante autismo nesta área. Basta lembramo-nos o que têm sido as suas declarações aos vários protestos dos professores a respeito, por exemplo, da questão da avaliação e da divisão absurda que foi a invenção de patamares profissionais. Ou o modo como aborda a questão dos professores contratados há longos e desesperantes anos. Por isso, as palavras laudatórias e tontas de José Sócrates à ministra, nas quais chega mesmo ao ridículo de sublinhar que “sem a determinação e coragem da ministra, não teríamos os resultados que podemos apresentar” e que “nós, socialistas, é que temos orgulho em tê-la como nossa ministra”, são reveladoras que entre a esquerda retórica (que ele, paradoxalmente, satiriza) e a “esquerda de acção” (auto-elogio socrático) vai, de facto, um grande e descomplexado passo.

sexta-feira, setembro 19, 2008

pcp e constança cunha e sá

Constança Cunha e Sá traça, no Público de ontem uma panorâmica do Partido Comunista que reflecte bem a posição da autora relativamente a este partido. Diz ela que "Jerónimo de Sousa reduziu o debate ideológico aos problemas concretos dos portugueses", para, de certo modo, "provar" o crescente aumento eleitoral do PCP. Mas depois remata com o seguinte: "Pode-se dizer que a necessidade de controlar o défice, o arranque de algumas reformas e o progressivo esvaziamento dos direitos adquiridos é um terreno fértil ao crescimento do PCP e à demagogia de grande parte das suas propostas".
Anoto o "grande parte das suas propostas", pressupondo que a autora aceita que outra "grande parte" não esteja marcada de pecadilhos demagógicos. Ora, não sei muito bem o que Constança Cunha e Sá entende por ideologia. Para mim, o PCP tem mantido uma coerência ideológica ao longo dos anos. Porventura, é essa visão um tanto estática que faz com que nunca tivesse estado (tirando os efémeros anos pós-revolucionários), verdadeiramente, no poder. Para além disso, quando a jornalista se refere aos problemas concretos dos portugueses que o Partido Comunista aponta (código de trabalho, insegurança, precariedade laboral, etc.) não estará a sobrelevar a ideologia do próprio partido?

quarta-feira, setembro 17, 2008

o estranho caso da mulher de gonçalo amaral

Veio-me parar às mãos que teclam neste computador o escrito que a Sr.ª D.ª Sofia Leal, que é mulher do ex-inspector da judiciária que tutelou o caso da menina inglesa desaparecida, escreveu nas páginas do Correio da Manhã. Na verdade, não é muito comum este tipo de achados. Um pouco (um naco, como diria António Barreto) dessa prosa: "As nossas filhas nunca compreenderam – e nós nunca conseguimos explicar-lhes que ‘motivos tão óbvios’ seriam esses que assim [com um afastamento imediato da investigação do caso Maddie] premiavam um pai que deixava as suas filhas para procurar uma criança que nem sequer conhecia e cujos pais a tinham negligenciado. Pena foi que a minha cara amiga Srª Dª Kate, já cá não estivesse à data, porque até poderia ter-nos sido de grande utilidade na tentativa de explicação dos ‘motivos óbvios’ da demissão do pai às nossas filhas..."
Bem, tanta piroseira e falta de bom-senso não merece grande contraditório. Seria o mesmo que questionar a Sr.ª D. Sofia por que razão os professores aturam as suas filhas e deixam os seus próprios filhos em casa, por vezes uma ou duas semanas. Ou os médicos. Ou os trolhas. Ou os juízes. Ou... Será mesmo verdade que por detrás de um grande homem está sempre uma grande mulher?..

um pouco de ética republicana

Peço emprestado (sem autorização) o texto de Baptista-Bastos hoje no DN na reflexão que construiu a respeito da recusa do ex-presidente da República Ramalho Eanes em receber os retroactivos (mais de um milhão de euros) a que tinha direito respeitantes à sua reforma como general.

a esquerda bloquista

É por estas e por outras que olhamos para o Bloco de Esquerda e vemos cada vez mais um agrupamento que se define de esquerda porque sim. Vem isto a propósito das declarações de João Semedo, deputado do partido, ao criticar o PCP por seguir uma política de extrema-direita. Tudo porque os comunistas, através do seu líder Jerónimo de Sousa, ousaram (o verbo encaixa aqui na perfeição tendo em conta as particularidades encefálicas do senhor deputado) esgrimir, no comício de encerramento da festa do Avante, um argumentário dedicado à questão da insegurança. Ora, como na cabecinha dos bloquistas (jovens e velhos) insegurança, polícias, criminalidade e outros temas afins são de direita, o tom comunista constitui, para a trupe, um verdadeiro sacrilégio. Eu sei que o Bloco foi constituído como um partido de ideias, conscientemente fora do arco governativo. Mas esta idiossincrasia não deve ser tubular. Um partido político deve ser, por definição, aberto, transparente, anti-tabus. Com certificadas paredes de vidro.

terça-feira, setembro 16, 2008

a escolaridade obrigatória

Tive inclinado para, desta vez, desculpar a Lurdes Rodrigues, ministra da educação. Com efeito, pretendia inverter o meu discurso crítico direccionando-o para os jornalistas, que inventam guerras entre estes e aqueles. Seria o caso da suposta discordância entre Cavaco Silva e Lurdes Rodrigues, quando aquele afirma, de modo categórico, que o alargamento da escolaridade obrigatória até ao 12º ano será uma inevitável realidade a curto prazo. Até que leio com mais atenção as declarações da responsável governativa: "[a escolaridade até ao 12º ano] seria um erro, prejudicaria as famílias e os alunos e não se conseguiria concretizar".
Acontece que a meta dos doze anos de escolaridade obrigatória sempre foi um entendimento aparentemente consensual entre os diversos intervenientes políticos. Mas foi preciso esta excitação toda em torno desta coisa que se chama Novas Oportunidades (não tenho, teoricamente, nada contra, antes pelo contrário) e afins para Lurdes Rodrigues inverter o seu discurso. Afinal, para quê a escolaridade obrigatória até ao 12º ano se tudo está a correr tão bem, em que o abandono precoce não é mais do que uma etapa de vida dos discentes. Até porque muitos destes conseguem o feito extraordinário de estarem simultaneamente fora e dentro do sistema educativo.

falência do lehman brothers

Confesso a minha inoperância relativamente aos mercados financeiros globais. Mas o que desejava saber é como é que um banco - o quarto maior banco de investimento dos EUA - que teve, em 2007 (há um ano!) o melhor ano de sempre da sua centenária história (o banco foi fundado em 1958), com receitas, lucros e capitalização bolsista extraordinárias, consegue iniciar um processo de inevitável e aparentemente irrecuperável crise financeira. Parece que atrás deste vêm outros (da área financeira ou não, como parece estar a ser o caso da multinacional informática HP, com um despedimento global de dezenas de milhares de trabalhadores). Desafortunadamente para a Lehaman Brothers, as autoridades federais norte-americanas não iniciaram um processo de solvência financeira, o que fizeram com as congéneres Bear Stearns, Indymac, Fannie Mae e Freddie Mac. Advertidamente, terão chegado a um ponto de não retorno no que diz respeito à intervenção do estado em operadoras financeiras com grande capacidade de intervenção à escala global (estaríamos, assim, perante uma paulatina e desconcertante nacionalização ou, na melhor das hipóteses, no início de uma aproximação ao regime chinês, que convive - aparentemente sem problemas - com a junção de dois sistemas teoricamente incompatíveis: o comunismo com o capitalismo).
O problema é que, ao contrário dos cidadãos comuns que, por motivos que lhes são extrínsecos, entram igualmente em colapso financeiro e social (perda de emprego, de auto-estima, etc.), os administradores que conseguiram este feito extraordinário nunca se verão a braços com este tipo de problemas. Uma falência, para eles, não é mais do que um encerramento definitivo no que diz respeito à labuta financeira (bolsa, banca, etc.). Nunca saberão o que é andar perdidos no meio de gente, a pensar no que irão dar de comer aos filhos dentro de duas ou três semanas. No fundo, é este tipo de "humanização", este tipo de "integração social" que mais falta faz ao paradigma neo-liberal que vivemos hoje em dia. No dia em que esta gente sentir as dores do cidadão comum, será este o dia em que o capitalismo selvagem que nos gere se transformará num outro tipo de orientação paradigmática. E este pressuposto pode muito bem ser estendido aos políticos. Afinal, são eles que prescindiram, encruamente, do primado da política em relação à economia.
Lamentável e infelizmente, a factura vem aí, seca e irrepreensível, na forma de juros e empréstimos por pagar. Consequentemente, as prisões (preventivas ou não) continuarão a aumentar. Só que os outros, aqueles que não têm empréstimos por pagar, causadores primeiros do desacerto económico, andarão sempre por aí, num "outro ramo" ou numa qualquer ilha do pacífico, a passar umas longas e imprudentes férias. Tudo em nome da filosofia do mercado global, que é mais ou menos dizer em nome do salve-se quem puder. E quem não puder, paciência.

estado condenado a pagar a pinto da costa

É o mesmo que se passou com Pedroso: uma decisão de primeira instância veio a ser anulada por um tribunal superior. Deste modo, o meu pensamento vai não para estas duas personalidades bafejadas por uma existência capaz de combater as injustiças que a justiça por vezes proporciona, mas para os outros, para aqueles que ficam à mercê de um qualquer juiz aligeirado que proporciona amiudadas vezes sentenças que reflectem não só a presença do magistrado, mas, sobretudo, o espelho da própria justiça.

quarta-feira, setembro 10, 2008

josé sócrates e a educação propagandística

Não sei se o homem trabalha somente para as estatísticas ou se é um especialista em propaganda. O que eu sei é que, por vezes, parece que exagera na sua própria orientação comunicacional (própria ou de alguma agência de comunicação). Vem isto a propósito das recentes declarações que o primeiro-ministro esboçou a propósito da diminuição das retenções nas escolas públicas. Assim, José Sócrates disparou, empolgado: "ao logo destes anos, fizemos mudanças nem sempre bem compreendidas, mas que hoje permitem que aos olhos da opinião pública os professores e a escola sejam mais bem vistos".
Ora, é este sentido obscuro e patético de missão inicialmente "mal compreendida", como se a verdade absoluta residisse nos gabinetes da 5 de Outubro (ideia que, por si só, dá vontade de rir), que faz com que Sócrates resvale, amiudadas vezes, para o ridículo. Na verdade, se existe profissão que desde sempre foi "bem vista" pelos portugueses é precisamente a dos professores. Do mesmo modo, falar desprendidamente de "opinião pública" é simplesmente irrelevante. Por outro lado, podíamos aventar aqui um número considerável de profissões que são "mal vistas pela opinião pública" e que, se nos guiarmos por este paradigma, revela-se mais fácil responsabilizar, negativamente, o governo. No fundo, chama-se a isto brincar com a educação.

(publicado no Público em 11-9-2008)

terça-feira, setembro 09, 2008

o futebol

O estado patológico que se desenvolve hilariantemente em torno do futebol português é deveras interessante. Eu propunha, desde já, um estudo de psicologia clínica em torno destas pessoas: dirigentes, jogadores (os mais acertados no meio de tudo isto), jornalistas e... comentadores. O jornal de hoje da SIC (presumo que o mesmo se passou nas outras estações) noticiou um furo jornalístico que foi a suposta agressão do jogador Dominguez do Futebol Clube do Porto ao Nuno Gomes, do Benfica. Seguidamente, repôs na emissão do telejornal o debate que aqueles três senhores (um do Porto, chamado Aguiar, outro do Sporting, que parece que é irmão da líder do PSD, e outro do Benfica, que é marido da jornalista Judite de Sousa) empreenderam em torno desta questão. Eu, que não sou cego, vi as imagens e só quem não percebe nada de desporto é que consegue vislumbrar uma agressão mútua entre os jogadores. Mas também não é isso que verdadeiramente me interessa. O que acho lamentável é o tempo que o futebol ocupa nas nossas vidas e que estes senhores (doutores, como convém) sejam pagos para dizer banalidades. Mas a maior insensatez de todas manifesta-se mesmo naquela massa de pessoas que os escuta.

coisas

vamos pela estrada e sentimo-nos bem. lá fora, o vento sopra, a neve cai, voam duas aves perdidas. eu sei que tenho de chegar a algum lugar...


neste momento...