domingo, outubro 12, 2008

A erc e as televisões

Antigamente, chamava-se Alta Autoridade para a Comunicação Social, sem dúvida um nome pomposo; agora, mais modesto, denomina-se Entidade Reguladora da Comunicação Social (ERC). Os portugueses em geral, nos quais eu me incluo, não davam pela existência de tão nobre e útil entidade, não fora algumas fugazes aparições noticiosas envolvendo, invariavelmente, os responsáveis da instituição. A última diz respeito ao chamado "dossiê Sócrates", em que o primeiro-ministro aparece como autor de uma frase, considerada - e bem! - como uma forma de pressão ilegítima sobre o livre e democrático funcionamento dum jornal, neste caso específico, o Público. Sócrates teria proferido, assim, seca e atabalhoadamente, digna de um filme de "mafiosos convictos" de classe B, a seguinte frase ao director do jornal, José Manuel Fernandes: "Fiquei com uma boa relação com o seu accionista [Paulo Azevedo, presidente do grupo Sonae, proprietário do periódico] e vamos ver se isso não se altera". Ora, conforme posteriormente se veio provar, nem o director do Público relatou esta extraordinária frase aos inquiridores da ERC, nem o primeiro-ministro a pronunciou. Tudo não passou de um lamentável erro, "de uma troca", segundo disse a Entidade Reguladora. Mais: Azeredo Lopes, que é o presidente da coisa, foi espevito a apontar o dedo arguidor a um pobre funcionário, que se "esqueceu de gravar o depoimento" de José Manuel Fernandes. Tudo isto está, obviamente, mal contado. E o que torna também esta miscelânea interessante é o facto de nenhum partido com assento parlamentar não ter exigido um célere e sério processo de investigação em torno do que, de facto, aconteceu. Limitaram-se a lamentar o sucedido, como aliás, fez, Azeredo Lopes.
Ora, o que eu verdadeiramente penso, não a respeito desta trapalhada, mas antes a respeito da ERC, é que ela não serve para nada. De facto, se tivermos em consideração que o objectivo primeiro da instituição é a "regulação e supervisão de todas as entidades que prossigam actividades de comunicação social em Portugal", não é difícil chegar à conclusão que a ERC é um vazio desalentado na regulação das "actividades de comunicação". Basta perdermos dois ou três dias e analisar as televisões. Na verdade, medidas tão simples como as regulações da publicidade entre os filmes (é praticamente impossível ver um filme numa das três televisões de canal aberto, em Portugal), das grelhas muitas vezes descabidas dos telejornais (quando abrem, por exemplo, com os 150 milhões de euros do Cristiano Ronaldo, deixando quase como nota de rodapé, um atentado no Iraque que causou dezenas de mortos) e/ou as durações demasiado excessivas dos mesmos, com publicidade (muitas das vezes desesperantemente longas) em simultâneo nos três canais, contribuiria para que se fundamentasse o propósito fundador da Entidade Reguladora para a Comunicação Social. Até porque estas medidas não faziam mais do que obrigar as televisões a respeitar, antes de tudo, o consumidor, isto é, o público. Mantendo-se o caos televisivo, um simples agendamento de um qualquer programa, um filme, por exemplo, revela-se uma tarefa impossível em qualquer lar do país. A não ser que se tenha acesso aos canais por cabo.

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vamos pela estrada e sentimo-nos bem. lá fora, o vento sopra, a neve cai, voam duas aves perdidas. eu sei que tenho de chegar a algum lugar...


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