quinta-feira, novembro 27, 2008

magalhães para timor

Gostei também de ouvir Xanana Gusmão falar do Magalhães...

(adenda: tenho mesmo que acrescentar que a frase de cima tem que ser olhada através "do manto diáfano da fantasia...")

a avaliação

O processo de avaliação dos professores encontra-se numa grande confusão, em que todos os protagonistas - ministério, sindicatos e professores - tentam, de algum modo, salvar a face. A ministra, que até aqui parecia um muro de betão armado, começa a dar sinais de evidente recuo, ao aligeirar, desarranjadamente, aquilo que apresentou como um projecto final. Acontece que as alterações propostas implicam, neste momento, uma confusão acrescida, em que o que era obrigatório antes, se tornou agora alternável, assim como varia - e de que maneira - o grau de importância de certos procedimentos. Ora, tudo isto nos faz reflectir sobre a efectiva capacidade da gente que gravita nos corredores do ministério da educação. A mim, pessoalmente, nunca me enganaram, ao contrário do que se passou com a maioria dos comentadores políticos da nossa praça, que sempre vislumbraram em Maria Lurdes Rodrigues uma espécie de D. Sebastião de saias. Alguns ainda resistem no panegírico. Mas estou em crer que esse (apesar de tudo) parco clima laudatório que ainda subsiste tem mais a ver com o desconhecimento do processo educativo. O regozijo com que a Ministra e Secretários de Estado se manifestaram relativamente à subida da média nacional de algumas disciplinas é exemplo da maneira como a educação é encarada. É que ninguém pode acreditar que, de um ano para o outro, a "reforma" (naturalmente entre aspas) começa a dar resultados palpáveis. Em educação, qualquer processo transformador tem que aguardar alguns anos (um ciclo de estudos?) para que os somatórios se possam espelhar num quadro comparativo. O PISA 2009 está aí à porta e, ou muito me engano, ou vamos ter uma grande decepção.
Por outro lado, os sindicatos não estão, neste momento, numa situação melhorada. Vieram agora com a exigência (normal e aconselhável) de suspender o processo de avaliação, ao mesmo tempo que propõem uma espécie de documento de auto-avaliação, o qual será acompanhado pelo conselho pedagógico. Dizem eles que é "uma solução simples, não administrativa e focada na vertente pedagógica que permita aos docentes serem avaliados este ano". Pois está visto que sim. Simples até demais. Na verdade, mais simples do que o que existia até então. A mensagem desta proposta não pode ter vindo na pior altura. Bastava aos sindicatos afirmarem desavergonhadamente, o seguinte: nós propomos reconstrução da avaliação que existia. Ponto final. Seria, portanto, a base de trabalho de um novo processo de avaliação. O que agora os sindicatos alvitraram é pior do que existia. A situação a que se chegou é, pois, caricata: de um lado, o ministério a remendar o que, concludentemente, sugeriu; do outro, o sindicato a inventar, aligeirando ainda mais o modelo que existia. Dito de outra maneira, ambos estão presos às suas próprias irredutibilidades.

(esboço do artigo publicado no jornal A Voz de Trás-os-Montes em 04/12/2008)

terça-feira, novembro 25, 2008

os cartazes em louvor de sócrates

Começa-me verdadeiramente a incomodar alguns cartazes que aparecem na televisão, aquando das visitas de Sócrates para inaugurar alguma coisa ou para distribuir não sei o quê num qualquer sítio carenciado, com mensagens tão asneadas como "obrigado Sócrates". Que eu saiba, era assim que Salazar era muitas vezes recebido em alguns desses lugares, por algumas pessoas que, curiosamente, são as mesmas que agora empunham esses ditos. Ou melhor, as mesmas (de carne e osso) naturalmente não podem ser, mas o princípio, esse desarranjo social que foi paulatinamente alicerçado na sociedade portuguesa do Estado Novo, persiste em se manter como uma verdadeira idiossincrasia psiconormativa da embriaguez política de alguns políticos.

sexta-feira, novembro 21, 2008

os remendos da ministra

A pergunta que deve ser feita, no meio de toda esta nevrose educativa, é a seguinte: o que levou Maria de Lurdes Rodrigues a alterar o que até então parecia inatacável? Apesar da retórica de costume, estou em crer que esta atitude da ministra a coloca num estado de fragilidade extrema. Pior do que isso, revela que se perdeu imenso tempo numa simples teimosia. Daí que a demissão deveria ter sido o posicionamento (político e intelectual) mais honesto.

terça-feira, novembro 18, 2008

hino ao cinismo político

Se podemos erigir declarações que desenvolvam cristalinamente o âmbito do despudor político, o que Pedro Passos Coelho afirmou de Manuela Ferreira Leite (a respeito do que esta disse sobre um hipotético congelamento da democracia por seis meses) revela-se, de forma peremptória, um verdadeiro paradigma. Vale a pena transcrever:
"[Manuela Ferreira Leite] corrigirá com certeza as suas afirmações [porque] não pode ter querido dizer aquilo que disse (...) todos temos dias melhores e dias piores e hoje não foi certamente um dia em que a dra. Ferreira Leite tenha estado bem, até porque há matérias em que um candidato a primeiro-ministro não pode deixar dúvidas nem ironizar (...) Tenho a certeza que a dra. Ferreira Leite não deixará de corrigir com rapidez o que não pode ter querido dizer".
O melhor, claro, vem no final: "Não contem comigo para estar a castigar publicamente a presidente do PSD, do meu partido".
Claro que não, Pedro, claro que não!...

maria de lurdes rodrigues

Ouvi agora Maria de Lurdes Rodrigues admitir que o processo de avaliação de professores é complexo, burocrático, activador de trabalho excessivo nas escolas... Não entendo como é que alguém consegue defender este modelo de avaliação, o qual abarca todas estas inoperâncias práticas e estruturantes.

manuela, a desajustada e... josé sócrates

Este post é também sobre Manuela Ferreira Leite. Mas o que me apraz dizer a respeito do "Eu não acredito em reformas, quando se está em democracia" e do "Quando não se está em democracia é outra conversa, eu digo como é que é e faz-se", e ainda do "E até não sei se a certa altura não é bom haver seis meses sem democracia, mete-se tudo na ordem e depois então venha a democracia", é que José Sócrates nasceu realmente num belíssimo dia de sol. Sabemos como é que chegou a líder do PS, com a trapalhada do Jorge Sampaio ao nomear Santana Lopes para formar governo e com a consequente demissão de Ferro Rodrigues da liderança do Partido Socialista. Veio depois a ajuda de Santana na obtenção da maioria absoluta (o pior resultado do PSD e o melhor do PS em legislativas). Seguiram-se líderes tão extraordinários como Marques Mendes (tendo em conta o que se seguiu, pode-se considerar que foi o melhor líder do PSD na oposição ao PS) e Filipe Menezes. Agora, depois das brumas e do nevoeiro desanuviarem, eis que surge aquela que arrumaria a casa política social democrata, de seu nome Manuela Ferreira Leite, a qual, por norma, aparecia sempre montada numa áurea cavaquista.
Ora, não foi difícil determinar que Manuela não tinha perfil para o cargo. Daí que surjam os teóricos da sociopolítica a desenvolverem as tradicionais teses da génese do PSD. Neste âmbito, a repetição é a norma: um partido que vive de líderes carismáticos (qual o que não vive?!) e de que desde Cavaco Silva esse pressuposto esteve inalteravelmente ausente, a vacuidade programática (em oposição aos princípios europeus social-democratas do PS), o PSD como um partido do poder e que, na oposição, respira maus ares, os barões, os baronetes, etc.
Deste modo, José Sócrates pode dormir descansado. Não será daqueles lados que a friagem assomará. Falta saber qual dos lados terá mais força para desproteger não só o PS como o PSD: se a direita ou a esquerda. Ou os dois.

segunda-feira, novembro 17, 2008

os cara tapada

Que raio de sentimento de impunidade pairará na massa encefálica de algumas criaturas quando, por exemplo, se dirigem, ameaçadora e disfarçadamente, aos polícias e jornalistas que esperam, à porta do tribunal, os seus colegas de uma claque de futebol, os quais hão de chegar numa carrinha celular? Na verdade, esta gente que anda por aí em claques de futebol ditas organizadas, muitas das quais parecem pequenas empresas, tem, a meu ver, tempo de antena a mais. Daí que a comunicação social, que gosta deste tipo de manifestações energúmenas, tenha também a sua quota-parte de responsabilidade. Aliás, é muito difícil, hoje em dia, desanexarmos a importância da televisão (um dos grande educadores dos tempos que correm) do que de muito de medonho se passa na nossa sociedade. Neste sentido, basta olharmos com atenção para as grelhas dos três canais generalistas, para a boçalidade que lá grassa, para entendermos que caminhamos para uma espécie de deseducação social e cívica. Assim, quando estes meninos deixarem de aparecer nos ecrãs das televisões, desencadear-se-á nesse mesmo instante o início do fim das suas efémeras relevâncias.

domingo, novembro 16, 2008

o fim do silêncio de manuela ferreira leite

Afinal, estava tudo programado. Manuela Ferreira Leite, a pouco mais de meio ano de um processo eleitoral longo e previsivelmente desgastante, iniciou um conjunto de ataques sectoriais à governação socialista. Dois alvos, por agora, e logo dos mais fragilizados (apetece perguntar: quem são os ministros deste governo que não se encontram em posições delicadas, muitos deles completamente desacreditados?...): a educação e a agricultura. No entanto, a líder do PSD não se livra das críticas. Agora já não por não falar, mas antes por falar e não apresentar alternativas. É um facto que Manuela costuma pôr-se a jeito, isto é, realiza (do ponto de vista verbal), alguns disparates (relação casamento procriação, por ex.). Mas também parece certo que a candidata a primeiro-ministro manifesta umas parecenças, relativamente ao modus operandi, com o seu amigo Cavaco Silva. Deste modo, estou propenso a crer que dentro de um ou dois meses elas (as propostas) aparecerão. Até lá, Manuela Ferreira Leite continuará a alimentar o escárnio jornalístico. E este, como sabemos, também conta.

sexta-feira, novembro 14, 2008

o exemplo dos professores de viseu

Alguns professores de Viseu vão processar José Sócrates por este ter afirmado que os professores nunca foram avaliados. Pela minha parte, congratulo-me pelo facto de as televisões terem finalmente dado relevo a uma verdade indesmentível. Com efeito, os professores sempre foram avaliados. É verdade que o processo de avaliação dos professores caiu numa espécie de inoperância orgânica. Todavia, tal facto não tinha obrigatoriamente que resultar na confusão que actualmente se vive. E se a culpa é maioritariamente da equipa de Maria de Lurdes Rodrigues, a qual se meteu num processo de avaliação sem saber ao certo do que se tratava (ao jeito de um experimentalismo pseudo-paliativo), também é verdade que os professores desde muito cedo se envergonharam na avaliação que haviam praticado até então nas escolas. Assim, bastaria a sustentação reiterada dessa verdade (com a óbvia determinação de desejar melhorias nesse mesmo processo avaliativo), para que a razão sempre morasse no lado das escolas, isto é no lado dos professores (afinal, as escolas são os professores e não o ministério). Mas não! Conhecedora das fragilidades da classe, Maria de Lurdes Rodrigues nunca desarmou e, teimosa e inscientemente, tenta levar a bom termo uma avaliação obtusa e incoerente.

(esboço do artigo publicado no jornal A Voz de Trás-os-Montes, em 20\11\2008)

quinta-feira, novembro 13, 2008

as desculpas de maria de lurdes

"Peço desculpa aos senhores professores de ter causado tanta desmotivação, mas é do interesse do país, dos alunos e das escolas. Espero que as escolas, os alunos e o país possam beneficiar desta disponibilidade dos professores para estar mais tempo na escola, é isso que eu espero".
É este tipo de frase, cínica na sua essência, que desacredita todo o edifício político do país. De facto, quando se olha para a ministra da educação declarar, com uma extraordinária candura, as desculpas aos professores pela desmotivação causada, não se vê mais do que a parte abjecta da política. Para além disso, nota-se que lhe restam já poucas, pouquíssimas saídas dignificantes deste seu cubículo infernal em que se tornou o seu ministério. Maria de Lurdes Rodrigues é, politicamente, inábil. Os seus secretários de estado são inábeis em tudo. Pelos vistos, querem afundar acreditando, sozinhos, num sistema de avaliação que ninguém aceita. É lá com eles. Mas o facto de não colocarem o lugar à disposição de Sócrates (o mínimo acto público que, nestas circunstâncias, é exigido) é revelador do perfil democrático desta gente.

a ministra, os secretários, os ovos, os tomates e os alunos

Lembram-se da aluna do Carolina Michaelis, no Porto, empurrando a professora por causa do seu telemóvel? Pois bem, multipliquem essa aluna por 200 ou 300, coloquem-nos às portas das escolas aquando de uma qualquer visita da ministra ou dos secretários de estado, e o resultado é uma espécie de omeleta de tomate. Ora, tanto o episódio de Fafe (as declarações do extraordinário presidente da Câmara, acusando os professores de mentores daquela turba, são verdadeiramente mentecaptas), como o da Escola Secundária D. Dinis, em Lisboa, revelam o perfil civilizacional da maior parte dos alunos das nossas escolas públicas. Daí que não entenda as declarações de duas professoras (daquela escola?), ao afirmarem, imbecilmente, que aqueles alunos são pacíficos e que nunca fizeram mal a ninguém. No entanto, estes amontoados de alunos vão, paradoxalmente, ao encontro das reivindicações dos professores no que diz respeito ao processo da avaliação de que estão a ser alvo. Explicando: alunos que contestam desta maneira uma ministra e dois secretários de estado, procederão, decerto, bem pior (numa relação proporcional ao processo de ensino-aprendizagem) dentro de uma sala de aulas. Daí que a Ministra da Educação deva reflectir no seguinte: esta atitude dos alunos é também um reflexo das políticas educativas que têm vindo a transformar - para pior - as escolas e, particularmente, o nível moral e cívico dos alunos. Numa perspectiva sistémica, em educação tudo se encontra interligado. Maria de Lurdes Rodrigues deveria saber isso.

terça-feira, novembro 11, 2008

a rentabilização dos estádios de futebol

Há assuntos que os governantes, mais tarde ou mais cedo, se vêem impelidos a aderir. Um mundial de futebol é um deles. Daí que Silva Pereira, o nosso ministro da Presidência, tenha dito que a ideia da organização (conjunta, com Espanha, até ver...) do mundial de futebol de 2018 pode ser uma boa forma de rentabilizar os estádios construídos aquando do Euro 2004. Como se sabe, a tendência megalómana e provinciana dos nossos governantes (um mal patológico do país) fez com que ficássemos com infra-estruturas desportivas à imagem da desigualdade social do país. Neste sentido, lembro-me de ver, quando foram apresentados os estádios para o Euro, a linha geográfica das cidades locatárias e dar por mim a reflectir (a concluir) que essa mesma linha não podia espelhar melhor a discriminação (outra imagem de marca do país) secular que o interior de Portugal tem sido alvo. Agora, Silva Pereira não arranja melhor argumento do que o da rentabilização dos estádios. Mais valia ter assumido, descomplexadamente, mais este "desígnio nacional".

o recado de manuel alegre

É evidente que concordo com os estados de alma de Manuel Alegre no que diz respeito à obsessão desastrosa de Maria de Lurdes Rodrigues para com todo este processo da avaliação dos professores e, particularmente, para com a manifestação que juntou a quase totalidade dos docentes, em Lisboa. De facto, Alegre anota dois ou três pontos importantes, os quais necessitam de debate urgente. Por exemplo, os programas e os conteúdos do ensino e também (acrescento eu) a própria carga horária completamente desajustada, assim como a primazia que se tem vindo a dar, de há uns anos para cá (em nome daquilo que se costuma designar por Ciências da Educação) das chamadas áreas curriculares não disciplinares. Já aqui escrevi a minha posição relativamente a este último aspecto. Com efeito, não consigo perceber, mesmo com muita força de vontade, as 4, 5 horas que os alunos do 2 e 3º ciclo do ensino básico passam, por semana, ao redor destas disciplinas. Bastaria olhar para o crescente aumento de casos de indisciplina nas escolas em alunos destes níveis de ensino, para verificarmos a inocuidade destas áreas disciplinares.
Todavia, o que me custa mais a entender, do ponto de vista de Alegre, é a sua preocupação relativamente a um resultado eleitoral que não permita ao PS alcançar a maioria absoluta. De acordo com o seu raciocínio, a continuação de Maria de Lurdes Rodrigues como ministra da Educação pode custar ao PS a maioria absoluta nas próximas eleições legislativas. Na verdade, na minha candura, nunca pensei que Alegre estivesse alguma vez preocupado com a maioria absoluta do PS. Na minha ingenuidade, eu até pensava que Alegre era contra a renovação dessa mesma maioria. Mas enfim, Alegre, o poeta-deputado; Alegre, o militante independente, Alegre, o ex-(e futuro)candidato presidencial é, afinal, também ele, um político... com tiques de político.

domingo, novembro 09, 2008

a reacção de sócrates e maria de lurdes à manifestação de professores

Houvesse outra oposição, ou melhor, estivesse o PSD mais bem posicionado nas sondagens e Lurdes Rodrigues estaria já despedida deste governo socialista. Com efeito, as reacções de ambos os governantes à manifestação de professores são impensáveis num governo com um mínimo de cultura democrática. Como é possível que justifiquem este extraordinário movimento contestatário de uma classe profissional (4 em cada cinco professores aderiu à manifestação...) de "lamentável oportunismo dos partidos políticos" (Sócrates) e de que tudo não passou de uma "forma de pressionar a ministra da Educação porque é ano de eleições" e que "perante ameaças e chantagens deste tipo, a minha reacção é de uma total tranquilidade e de um sorriso" (Lurdes Rodrigues)?!... Alguém com bom senso e de boa fé acredita que, com esta adesão em massa dos professores, o processo avaliativo em curso nas escolas é, de facto, o melhor para garantir "a qualidade do sistema de ensino, que permita distinguir aqueles que são os melhores professores" (Lurdes Rodrigues)? Na verdade, o que para muitos era, de certa forma, o resultado de um programa político bem pensado para o sistema educativo português, transformou-se agora numa simples obsessão por parte da ministra e dos seus secretários de estado. Neste sentido, basta olharmos para as declarações de Maria de Lurdes Rodrigues, quando afirma, por exemplo, num apaziguamento de alma desconcertante, que "estão criadas condições institucionais e legais para que se concretize a avaliação" e que "não tem sentido para mim falar de outro modelo de avaliação" e ainda que "suspender [o processo de avaliação] significa desistir e eu não desisto”, para facilmente aferirmos que o que está aqui em causa será mais facilmente intuído dentro de uma perspectiva psicológica.

santana lopes igual a santana lopes

Santana Lopes deu hoje uma longa entrevista ao Público. Devo dizer que acho um exagero toda a celeuma que se cria em volta da personagem, a respeito do seu sistemático e putativo regresso à vida política. Na verdade, Santana nunca dela saiu. E, para mais, ele tem todo o direito de querer contribuir, com o seu auto-proclamado virtuosismo, para o desenvolvimento do país. Neste ponto, a comunicação social não é imparcial, visto que outros não são assim tratados, embora haja razões para que isso aconteça. Mas Santana é especial. E a entrevista, delirante, prova isso. Não vou tratar aqui os pontos vincadamente políticos da sua análise. Com efeito, o ex-presidente do PSD não consegue sair do claustro analítico em que ele próprio, invariavelmente, se mete. Neste sentido, tudo gira à sua volta e os outros não são mais do que meras personagens secundárias. Ora através da ameaça reiterada em criar um novo partido político ("não tenho planos para isso", afirma-o circunspecto), ora através das hostilidades pessoais ou das imperfeições ideológicas de que é muitas vezes acusado ("eu luto muito por ideias e por obras...", disse, seriamente), ora através da imagem que transparece para a opinião pública, contrária ao que ele gravemente proclama ("eu quando sucedi a Durão Barroso não pensei em mim", asseverou), ora ainda através da injustiça que foi a sua destituição do cargo de primeiro-ministro ("[Jorge Sampaio] resvalou para um terreno de oposição ao governo, logo desde a tomada de posse", acusa, ainda com mágoa, Santana), tudo serve para que o ex-primeiro-ministro se institua numa espécie de eterno menino guerreiro nacional, incompreendido e perseguido. Por isso, Santana Lopes não desiste, pois um dia o seu zénite chegará e, com ele, Portugal entrará numa nova etapa da sua gloriosa história. Mas, enquanto esse dia não chega, Santana Lopes não faz mais do que a sua auto-construção, o que passa, em muito, por desmentir muito do que é publicado a seu respeito na imprensa.
Como sabemos, uma dessas mistificações tem a ver com o seu (putativo) aprazimento pela chamada vida social. Nisto, o agora auto-proclamado (embora ele recuse esta terminologia) candidato à Câmara de Lisboa é peremptório: "eu não gosto da vida social. Odeio." Pelos vistos, a repórter sorriu, pois ele rapidamente retorquiu: "Pode rir-se à vontade. Ninguém acredita [ele não gosta que lhe chamem Calimero]. Mas detesto. Recuso tudo que posso." Diz mesmo que "não frequento sítios de desregramento de comportamentos". Ora, na mesma entrevista, algumas perguntas e respostas depois, já Santana, à questão astuciosa do jornalista, responde que "Sempre gostei de ir a uma discoteca. Ouvir música, dançar..." e que "gosto de ir ao sábado à noite jantar a um restaurante com amigos, depois podemos ir beber um copo". Mas ele avisa: "a maior parte das noites não saio." Só mesmo com sacrifício: "olhe, sábado tenho uma festa de anos. É uma festa com muita gente, enfim, tenho de ir. Mas por mim, não vou. Sei que a minha imagem é ao contrário, não há nada a fazer. Agora, se me perguntar: vai a recepções de embaixadas? Não, não vou." Continua o hilariante Santana Lopes: "Nesse dia fui a três cerimónias: essa, a entrega do prémio da Fundação Champalimaud e outra no Espaço Chiado. Era da sobrinha do rei de Espanha (...) Lançava um produto e convidou-me". Finalmente, a vertente social da entrevista com Santana Lopes a reconhecer que, quando era Primeiro-Ministro, entrou no bar Alcantâra-Mar (presume-se com a segurança toda atrás) para "dar um abraço a uma amiga minha que comemorava os seus 50 anos".
E é desta maneira que Santana Lopes jura a pés juntos que não é lá muito dado à vida social. É capaz de ter razão…

(publicado em A Voz de Trás-os-Montes, em 13/11/2008)

sábado, novembro 08, 2008

o bpn ou um refúgio dourado

A lista é interessante: Manuel Dias Loureiro, Rui Manchete, Amílcar Theias, Daniel Sanches, Arlindo de Carvalho, Miguel Cadilhe e o agora dado em parte incerta algures no Brasil José Oliveira e Costa. De comum, encontramos um fio condutor: todos eles foram políticos com responsabilidades governativas, desde Ministros de Estado (um deles - Dias Loureiro - tem, actualmente, lugar no Conselho de Estado) a Secretários de Estado. Não interessa muito, neste caso, a infeliz coincidência de estarem ligados ao PSD. Na verdade, estou propenso a crer que não se trata mais do que isso: uma infeliz coincidência, pois o PS (o outro partido do arco governamental em Portugal) é, neste âmbito, uma espécie de irmão siamês do partido de Cavaco Silva (ah!... é verdade: todos eles vêm dos anos áureos do cavaquismo...).
O que me interessa aqui focar, telegraficamente (penso que não podemos aprofundar muito estas coisas, visto que nem o alheado Vítor Constâncio consegue conhecer o que se encontra por debaixo da espuma noticiosa que alguma imprensa tenta, determinadamente, propagandear) diz respeito à inclinação de muitos grupos empresariais em contratar ex-ministros e secretários de estado para quadros muito bem remunerados das suas empresas. Qual a razão? Acaso eles fizeram obra que fosse motivo de orgulho pessoal e/ou nacional? Tirando um ou dois casos (que não se encontram claramente no BPN), os políticos que são contratados por estes grupos económicos só o são por mera questão de marketing. Neste sentido, muitos destes senhores serão invariavelmente apresentados como o sr. Dr. X, ex ministro disto e daquilo; o Sr. Y, ex-ministro de Cavaco Silva... e por aí adiante. Mas tudo isto acontece porque vivemos ainda no reino da parvónia, em que muitos deles têm como trunfo negocial o facto de terem jogado, um dia golfe com um qualquer presidente dos EUA (há para aí um que se gaba disto, penso que é Dias Loureiro). Mas o que é estranhamente verdade é que tudo isto, no mundo obscuro dos negócios da banca, conta. Como, aliás, se vê.

sexta-feira, novembro 07, 2008

o auto-julgamento de fátima felgueiras

Verdadeiramente curiosa foi a interpretação que Fátima Felgueiras fez da sentença que a condenou à perda do mandato e a três anos de pena suspensa. Para a autarca, o que se passou foi uma libertação (e não uma condenação, como ela própria realçou). Tudo isto resulta, obviamente, que Fátima Felgueiras esperava muito pior, pois quem sai do tribunal como ela saiu, aliviadíssima, é porque lá entrou com peso a mais... ou a menos.

quinta-feira, novembro 06, 2008

a manifestação de professores

No próximo sábado, vamos voltar a ver professores dos diversos ciclos de ensino - educadores de infância incluídos - empunharem, orgulhosa a dinamicamente, gritos de revolta contra a ministra, o ministro, os secretários de estado e tudo o mais que se mexa no Ministério da Educação. Vai ser, estou certo, uma - a segunda - mega-manifestação desta classe profissional. Aparecerão também os costumeiros sindicalistas envergonhados, convertidos e declarados. Tudo em nome dum ensino mais digno. Sábado à noite, depois de um dia bem passado nas ruas de Lisboa, já completamente desopilados de semanas de frustrações pedagógicas, os professores e educadores regressam às suas casinhas. Alguns sentar-se-ão, ainda nessa mesma noite, à sombra de um candeeiro a corrigir testes ou a preparar aulas. Outros descansarão, simplesmente. Mas o que se revela efectivamente certo é que na segunda feira de manhã, grande parte destes professores estarão nas suas escolas a negociar o processo de avaliação com o conselho executivo, ao mesmo tempo que, ainda com alguma exaltação da véspera, pronunciarão umas concludentes e orgulhosas palavras de ordem contra a ministra, o ministro e tudo o que se mexa no ministério da educação...

a vitória de obama

Será agora oportuno definir o seguinte: a vitória de Barak Obama é, efectivamente, um facto histórico extraordinário. Ainda ontem vi na televisão o filme Ray Charles e, ao olhos de um americano dos meados do século passado (e dos anos 60... ou 70... ou mesmo 80!...), pensar que um afro-americano poderia tornar-se presidente dos Estados Unidos seria um prognóstico no mínimo alucinante. Numa perspectiva sociológica, este arrombo na sociedade norte-americana será motivo, no âmbito das ciências sociais, para investigações futuras. Quanto ao plano político, parece-me óbvio que Barak Obama representa - mais a nível internacional do que propriamente interno - uma mudança de paradigma, o qual se alicerça numa postura mais dialogante e, consequentemente, menos prepotente e igualmente com uma menor fúria belicista. No entanto, não sou dos que entram em euforias desmedidas. Ele já deu sinais no mínimo estranhos, quando, por exemplo, referiu que matará Bin Laden, fazendo lembrar a paranóia bushiana quando afirmava, à cowboy, que queria Bin Laden, morto ou vivo. Mário Soares, a este propósito já lembrou, acertadamente: num estado de direito, não se pode afirmar uma coisa dessas: os criminosos têm direito a um julgamento. Mesmo Bin Laden! É provável que Obama tivesse proferido estas palavras num contexto de campanha eleitoral (ganhou, decerto, alguns milhares de votos mais conservadores com esta frase bombástica). É meu desejo que assim seja.
Um outro aspecto que gostaria de realçar diz respeito ao jargão jornalístico de que na América tudo é possível, referindo-se, precisamente, ao facto de um afro-americano ter sido eleito Presidente dos Estados Unidos. Por norma, os jornais começam este tipo de raciocínio realçando o percurso biográfico de Obama: pai emigrante, classe média, estudos, etc. Nesta contextura, não é só na América que "tudo é possível". A igualdade de oportunidades faz parte de qualquer país civilizado, tornando-se mesmo uma conquista dos mais elementares direitos humanos. Em Portugal, por exemplo, temos um presidente da República que, em miúdo, ajudou muito provavelmente, o pai na bomba de gasolina que este possuía algures em Boliqueime, no Algarve. E ainda bem que assim é. Acontece que a América estava mal habituada, com a omnipresença política de certas dinastias, desde os Keneddys, os Clintons e agora os Bush. Isso é que não era saudável.

terça-feira, novembro 04, 2008

bnp

É interessante vermos Miguel Cadilhe acusar o Banco de Portugal que falhou na fiscalização ao banco a que preside. E eu que pensava que uma das funções primeiras de um presidente de qualquer banco seria precisamente a da fiscalização do próprio banco!...

o vendedor de computadores

O que faz um primeiro-ministro, em plena cimeira Ibero-Americana, colocar-se numa posição de uma espécie de promotor comercial de uma empresa? Parece-me crível que a tomada de posição de José Sócrates, ao propagandear o computador Magalhães, não foi ingénua. Ele sabia que os partidos da oposição, com Louçã à cabeça (Manuela Ferreira Leite manteve um acostumado e - desta vez - sapiente silêncio) não deixariam passar esta sua excentricidade. E é precisamente este alarido que o primeiro-ministro, neste momento, mais precisa. Num momento em que os bancos portugueses (e europeus) estão à beira de um ataque de nervos, em que os professores se preparam para mais uma mega-manifestação, em que o fantasma do desemprego assoma a cada dia que passa e em que a taxa de crescimento para o próximo ano será, com sorte, de 0, 5%, o barulho em torno de um assunto colateral como é a apresentação aos seus colegas ibero-americanos de um computador “made in Portugal” (afinal, é ou não é português?...) favorece – e de que maneira! – a agenda política do governo. Para além disso, José Sócrates demonstrou, com esta atitude de vendedor, uma postura que os portugueses (principalmente aqueles que decidem eleições com o seu voto – o chamado “centrão”) gostam: um homem “sem peneiras” que não se importa de agarrar num computador e, com umas piadinhas à mistura, fazer uma pequena demonstração relativamente ao seu funcionamento.
No entanto, esta pantomina criada por Sócrates revela o que de pior ele, politicamente, circunscreve: a vacuidade do seu ideário político, ou melhor, a “nobreza” das suas convicções. Com efeito, nem mesmo aquelas frases soltas que tanto gosta de citar (“alguém disse que…”) o libertam das amarras desguarnecidas desta realidade. A presente crise económico-financeira serve como paradigma: passa de um neo-liberalismo encapotado em esquerda moderna (com que ganhou o partido), para uma esquerda que acusa esse mesmo neo-liberalismo de protagonizar um “capitalismo selvagem”. É o tempo em que vivemos, dirão alguns. É verdade. Mas convém não esquecer que são os Homens que devem estar à frente do tempo, modelando-o, e não o contrário.

(publicado em A Voz de Trás-os-Montes, em 06\11\2008)

coisas

vamos pela estrada e sentimo-nos bem. lá fora, o vento sopra, a neve cai, voam duas aves perdidas. eu sei que tenho de chegar a algum lugar...


neste momento...