domingo, maio 31, 2009

uma espécie de farsa

O que se tem passado na actual campanha para o Parlamento Europeu configura, no âmbito dos dois grandes partidos do regime, uma espécie de farsa política. É verdades que nas cadeiras parlamentares, em Estrasburgo, PS e PSD se sentam, por imperativos formais, em hemisférios opostos: o PS fazendo parte do Grupo Socialista do Parlamento Europeu e o PSD do Grupo Popular Europeu. Todavia, os dois partidos nunca assumiram, ao longo destes 25 anos, qualquer dissemelhança (moeda única, vários tratados, o extraordinário apoio a Barroso, etc.), não se distinguindo, portanto, em matéria de política europeia. Na verdade, ambos continuam numa espécie de princípio iniciático, cujo paradigma não é mais do que a assunção de certos acordos e tratados que impulsionam a Europa como uma união de Estados. Ou seja: nenhum deles desenvolve uma campanha tendo em conta a linha orientadora dos respectivos grupos parlamentares, o que, de certo modo, seria o que melhor projectava o Parlamento Europeu e a União Europeia. Por isso, não havendo nada que os distinga, a única solução é virarem-se, na discussão eleitoral, para o país. Daí que estejamos, nesta campanha, relativamente a estes dois partidos, em presença de uma farsa política, pois o que se vai configurando não é mais do que uma pré-campanha legislativa.

sábado, maio 30, 2009

salário igual para trabalho igual

O "salário igual para trabalho igual" pode ser considerado como uma espécie de slogan de um tempo em que a luta pela democracia se fazia de grandes manifestações populares, de repetidas tentativas idealistas de projectar uma sociedade fraterna, justa e solidária, em que as injustiças sociais não fizessem naturalmente parte. Ora, parece que o Parlamento Europeu redescobriu este paradigma. Pelo menos, é o que parece, se avaliarmos o novo estatuto de deputado, o qual se rege, no que diz respeito à estrutura salarial, por um vencimento único. Convém lembrar que, até aqui, cada deputado europeu era remunerado de acordo com a tabela dos respectivos parlamentos nacionais (em Portugal, um deputado da Assembleia da República aufere um ordenado, fora despesas de representação, de 3815 euros mensais). Como é normal em períodos de transição normativos, cada deputado agora eleito pode optar: ou o anterior, ou o actual estatuto remuneratório (ao nível do salário e/ou da reforma). Entre os nossos candidatos a deputados europeus, parece que só Ilda Figueiredo, "por coerência", segundo a própria - uma vez que o PCP sempre se opôs a um salário único -, encaminha a sua remuneração de acordo com o anterior regime, isto é, receberá o mesmo que um deputado nacional. Os outros - pelo menos aqueles que têm voz, visto que ainda ninguém viu e ouviu a maioria dos deputados concorrentes -, absorvem, inequivocamente, uma tendência igualitarista: salário igual para trabalho igual. Foi pelo menos assim que conjecturou Edite Estrela (agradeço-lhe o título do post), ressalvando, no entanto, que a decisão será tomada em conjunto (que conjunto?), o que a não impediu de direccionar, desde logo, o sentido de voto "do conjunto", que recairá, singelamente, no "novo sistema". Quanto aos restantes deputados (os tais que se ouvem), Carlos Coelho, do PSD, optará também pelo novo sistema. O bloquista Miguel Portas acha este novo método "mais correcto", apesar de ter votado contra o princípio do salário único (!). Acautelou-se, contudo (tal como Edite Estrela), afirmando que discutirá o tema com a direcção do seu partido. Quanto ao CDS, parece que não se pronunciou sobre o assunto, mas não é difícil descortinar a sua inclinação.
Quero desde já afirmar que concordo com o princípio que está subjacente à lei que define os vencimentos dos deputados europeus, isto é, salário igual para trabalho igual. Acontece que toda esta panóplia legislativo-salarial deveria ser ampliada para todas as profissões no espaço europeu. Assim, um professor, por exemplo, em Portugal, ganharia o mesmo (com habilitações e anos de serviço similares) que um outro professor em Espanha ou Inglaterra; um médico ou um enfermeiro usufruiriam dos mesmos ordenados que os seus congéneres franceses ou alemães. E por aí adiante. Mas desenganem-se quem pensa que isto não se passa já em alguns estatutos sócio-profissionais. Basta olharmos para a folha salarial de muitos do nossos presidentes e directores de empresas públicas, para facilmente verificarmos que o princípio igualitário que serve de mote a este escrito se patenteia na sua plenitude. Os exemplos fervem, mas vou-me limitar a dois ou três.
Carlos Santos, até assumir a liderança do Millennium BCP, ganhava perto de 25 mil euros por mês na Caixa Geral de Depósitos, acrescidos de regalias várias: carro de serviço (valor 86742 euros), 2540 euros anuais em subsídio de refeição, 2973 euros para gastos com combustível e 8090 euros para despesas de telemóvel. Ou seja: o presidente do banco público arrecadava, anualmente, mais ou menos 516 mil euros anuais.
Carlos Tavares, presidente da Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM) consegue alcançar, no seu ordenado base, 17315 euros por mês, fora outras regalias.
E, claro, o nosso Vítor Constâncio que, ao que se julga, é um dos governadores de bancos centrais do mundo com melhores benesses remuneratórias.
Afinal, há ou não há salários iguais para trabalhos iguais?

sexta-feira, maio 29, 2009

vital moreira e o portugal positivo

Estou cada vez mais convencido que Vital Moreira foi um erro de casting no PS. Ouvindo-o, não se percebe muito bem qual o seu papel na própria campanha eleitoral. Por vezes, ele não faz mais do que cumprir um papel de lebre, a qual prepara, afeiçoadamente, a pré-campanha legislativa. Ademais, o Portugal que ele vislumbra não é, certamente, aquele que a maioria dos portugueses atinge.

visitas de estudo em escolas públicas: uma correcção

Quero fazer um reconhecimento ao que escrevi aqui relativamente a uma visita de estudo de uma escola. Trata-se, como disse, de uma visita à Serra da Estrela no âmbito da disciplina de Religião e Moral e Católica. Os preços estavam errados. Disse que cada aluno desembolsava 80 euros, mas não é verdade: são 140.

quinta-feira, maio 28, 2009

o juiz do caso alexandra

Não sou dos que pensam que os juízes devem permanecer numa desprovida redoma de vidro. Nestas coisas, o bom senso deveria acabar por ditar as suas leis (Cândida Almeida não usufruiu, decididamente, desta qualidade, no que diz respeito à chamada vertigem mediática). Agora o que nunca pensei ver foi um juiz a dar uma entrevista de cara tapada, ainda para mais quando o que está aqui em causa não ultrapassa o âmbito de uma esfera familiar. Mas mais do que o resguardo do rosto, é sua qualidade discursiva que me incomoda mais. Mas até percebo: para ir à televisão dizer inutilidades, o melhor é não dar a cara. Mesmo que esta seja projectada, reflexivamente, no polimento brilhante da parte superior de uma mesa.

(publicado no Público, em 02/06/2009)

quarta-feira, maio 27, 2009

futebol falido

Confesso que sigo pouco o fenómeno futebolístico. Entrego-me, essencialmente, aos resultados. Assim, quando me aparecem à frente notícias em que, por exemplo, Soares Franco (e tive que ir ver quem era Soares Franco, ou melhor, eu sabia que era presidente, mas não tinha a certeza se era o actual) afirma que o Sporting está em falência técnica (Público de hoje) tenho de admitir o seguinte: o futebol é a modalidade empresarial mais acrobata (em relação às contas) que existe entre nós. Li a entrevista. E o modo como Soares Franco aborda os milhões de euros de passivo (230 milhões em dívida bancária é o que o clube de Alvalade desfruta) é, de facto, estonteante. Diz o ainda presidente do Sporting que o clube chegou a perder 31 milhões de euros por ano, mas que agora já não é assim, pois "esta situação reequilibrou-se". Convém sublinhar que o reequilibrar-se, para ele, quer dizer, alucinadamente, o seguinte: "no ano passado, perdeu dez milhões, no anterior tinha ganho seis e antes terá perdido outros dez milhões". Penso que não será caso único em Portugal. E com este cenário, temo que qualquer dia, desaponte um BPN futebolístico. Já os há, na verdade. Mas são pequeninos.

segunda-feira, maio 25, 2009

mensagens nas auto-estradas

Tenho dado conta que as auto-estradas estão povoadas de novas informações sobre o preço dos combustíveis. Pasmo-me. Não consigo vislumbrar a utilidade daquilo. Com efeito, grassa por aí, nalgum canto ministerial, uma obscura tendência para besuntar o meio ambiente com estranhas e fundamentalistas visões pictóricas. A quem interessará, verdadeiramente, para quem conduz numa auto-estrada, saber que a Galp tem o gasóleo um cêntimo mais barato do que a Repsol e que esta vende a gasolina sem chumbo 95 octanas dois cêntimos mais caro que a Galp, mas um cêntimo a menos que a Cepsa? Acaso esquecem-se que um via rápida não se afigura, decididamente, o local ideal para tão profundas análises comparativas?

(publicado no Público, em 31/maio/09)

quinta-feira, maio 21, 2009

figo a presidente

O título do primeiro e último post relativamente a este assunto terminava com um ponto de interrogação. Decidi copiá-lo, mas agora retirando a sempre expansiva retórica interrogativa. Tudo porque me pareceu conveniente quando ouvi Madaíl referir que Luís Figo tem perfil para presidente da Federação Portuguesa de Futebol. Esta gente não é, definitivamente, muito dada à aprendizagem. E, para além disso, não consegue perceber que uma opinião deste tipo (Madaíl manifestou mesmo um eventual apoio a uma candidatura do jogador) é um tanto obscena, na medida em que é suposto vivermos num tempo de clarividência total, sem subterfúgios amigalhaços deste tipo. Dito de outra maneira: não se pode andar por aí a distribuir tachos. Nem às claras, nem às escuras. De uma vez por todas, isto deve acabar na sociedade portuguesa. Se Figo quiser concorrer ao que quer que seja, pois então que concorra. Madaíl tem a tão simples obrigação de estar calado. Que é, bem vistas as coisas, quando se ouve qualitativamente melhor.

o ponto de viragem

É uma tentação. Ainda para mais quando se aproximam eleições. Já Santana Lopes caiu nela, tal como o ministro Pinho e outros antes destes. Agora, foi a vez de Teixeira dos Santos, Ministro das Finanças, não resistir. Declarou que estamos num ponto de viragem. Da crise, entenda-se. O que esta gente não alcança, definitivamente, entender é que a crise, muito mais que meros indicativos numéricos, tem a ver com outro género de realidades. Assim, no mesmo dia em que o Ministro das Finanças afiançava o ponto de viragem, na Autoeuropa pairava a sombra da deslocalização e da não renovação de mais de duzentos contratos a prazo. O mesmo se passa com o avolumar do número de desempregados (e dos trabalhadores precários) que todos os dias teimam em contrariar qualquer efémera esperança de um nivelamento socio-profissional. A crise é muito mais do que números. Foi assim que Guterres ganhou umas legislativas. As pessoas não são números, lembram-se?

(publicado no Público,em 26/05/2009)

quarta-feira, maio 20, 2009

o descrédito político

Sabemos todos que o descrédito em relação à política tem vindo a crescer cada ano que passa. Na verdade, podemos agrupar, socialmente, teorias várias. No entanto, não devemos colocar de lado os políticos e a própria política que se auto-alimenta através de uma legislação pronto-a-vestir. O exemplo das pseudocandidaturas de Elisa Ferreira, Ana Gomes (e Edite Estrela?) ao Parlamento Europeu e a autarquias pode ser considerado um paradigma deste descrédito. Como é possível que haja um valimento legal numa situação em que duas pessoas se candidatam a dois lugares distintos? Situações destas deveriam ser, pura e simplesmente proibidas por lei. Por uma questão de decência. Um outro exemplo deste calibre aconteceu quando António Costa saiu de ministro da Administração Interna para se candidatar ao convincente cargo de presidente da Câmara Municipal de Lisboa. Toda a gente achou normal que um ministro de Portugal se afastasse do seu cargo (que jurou cumprir), a mando do seu partido, para ocupar um determinado lugar afastado da esfera ministerial. Se existe exemplo em que partido e governo se embrenham numa aleivosa condição política, este é, sem dúvida, um deles. Ora, são situações deste tipo - que são comuns a todos os partidos - que urgem expungir. Estou em crer que estas situações farão parte, um dia, de indignos episódios da história política e social do nosso país. Resta-nos a triste e decadente consolação que servirão, porventura, de objecto de estudo da ciência social e política.

terça-feira, maio 19, 2009

eleições no Porto

Elisa Ferreira passou o seu próprio atestado de derrota ao aceitar emprestar levianamente o seu nome a duas listas electivas: a do Parlamento Europeu e como candidata a Presidente da Câmara Municipal do Porto. Ouvi agora Rui Rio, cujo argumentário (já eleitoral), do ponto de vista político e ético, faz todo o sentido. Ninguém pode estar de boa fé em duas candidaturas tão díspares.

a suspensão da professora

Independentemente do desastre que foi a intervenção da professora naquela sala de aula, numa turma do terceiro ciclo, faz-me impressão a rapidez da suspensão, deliberada pela Direcção Regional de Educação do Norte. Afinal, está um processo a decorrer (ou ainda nem se iniciou). Revela-se-me claro que uma situação destas foi, para o ministério, uma espécie de oferenda antecipada, num ano lectivo especialmente conturbado (o mais pequenino adjectivo que consigo esconjurar). No fundo, trata-se da continuação de um clima de intimidação que tão bem tem resultado nas escolas deste paradoxal país.

segunda-feira, maio 18, 2009

figo a presidente?

Este tipo de doseamento excessivo em torno do futebol faz com que, por exemplo, Luís Figo, segundos após de dar por terminada uma brilhante carreira como futebolista, se aventure, ainda que de forma hipotética, a declarar o seu interesse pelo cargo de presidente da Federação Portuguesa de Futebol. Não é propriamente que esteja em causa a legitimidade de Figo. O que em parece altamente criticável é a infantilização disto tudo, de quem - como quase todos os craques do futebol - está habituado a ver, de forma terceiro-mundista, o mundo a seus pés.

intrujices na política

E por falar em intrujices (ver post anterior), os deputado britânicos deram uma grande ajuda para consolidar o descrédito que se vive com a política na Europa. Como se sabe, o caso é semelhante às famosas viagens fantasmas dos nossos deputados. O que se me revela extraordinário é que, quando se pede, por exemplo, a suspensão de funções do presidente do Eurojust, Lopes da Mota, por estar a ser alvo de um processo disciplinar (e muitos destes puristas acusadores são "deputados fantasmas"), nunca se ter aventado a substituição destes representantes da nação que andaram, durante anos, em lamentáveis intrujices.

domingo, maio 17, 2009

o problema das listas para vital moreira

Vital Moreira, o cabeça de lista do PS às eleições europeias, anda um bocado destrambelhado com a problemática quase existencial das listas. Ouvindo-o proclamar que os restantes partidos têm listas fantasmas (pois só se conhecem os cabeças de lista, segundo ele) é caricato. Que eu saiba, o que se encontra mais próximo de uma visão fantasmagórica é a própria lista que ele representa, apesar da "eminência" das personalidades que a compõem. De facto, estar no parlamento europeu e concorrer a uma câmara municipal não é, de facto, para qualquer um. Neste sentido, não basta, como pendor justificativo, o enquadramento legal da coisa. Para mim, mais importante do que formalismos legitimistas, é a paixão, no sentido de uma verdadeira querença. É que eu sou dos que pensam que a política é também feita com paixão, com vontade, com o desejo de uma afirmação de valores. Por isso, colocar ao mesmo nível do combate político um lugar de deputado europeu e a presidência de uma câmara municipal é uma verdadeira intrujice.

as provas de aferição

O que se pretende com

Primeira parte:
"Leia em voz alta:
'Agora vou distribuir as provas. Deixem as provas com as capas para baixo'; 'Podem voltar as provas. Escrevam o vosso nome no espaço destinado ao nome'; 'Querem perguntar alguma coisa?'" "Desloque-se pela sala, com frequência", "Rubrique o enunciado no local reservado para o efeito"."Leia em voz alta: 'Ainda têm 15 minutos'; 'Acabou o tempo'. 'Estejam à porta da sala às 11h e 20 minutos em ponto'. 'Podem sair'".
Segunda parte:
"Leia em voz alta o seguinte:
'Agora vão iniciar a segunda parte da prova. Podem começar. Bom trabalho!'""Recolha as provas e os rascunhos". "Mande sair os alunos, lendo em voz alta: 'Podem sair. Obrigado pela vossa colaboração!'"

não é mais do que criar, nas escolas, um clima de medo e, na cabeça dos professores, uma envolvência neurasténica, a qual tem sido, aliás, cultivada ao longo do ano lectivo. É perfeitamente ridículo as normas que obrigam, extremadamente, os professores a este papelucho.

rtp-um dia em cheio

Foi um dia grande para a Rádio Televisão Portuguesa! Um dia de outros tempos. Fátima e futebol; Fátima e Benfica. Dois directos. Um notável serviço público!

sábado, maio 16, 2009

uma mudança, outra estratégia

Basta andar pelos centros e arredores das cidades portuguesas para notar que existe uma verdadeira degradação em desenvolvimento. É lamentável que isto aconteça, ainda para mais quando é Portugal um país que recebe muita gente de fora, muitos turistas, que se revelam de uma enormíssima importância para o equilíbrio das nossas finanças públicas. Daí que não compreenda que o actual Governo (todos os governos) não aposte num outro paradigma de desenvolvimento, o qual deveria passar por uma verdadeira ecologia urbana, para que as cidades e os seus arredores se convertam em lugares aprazíveis para viver, passear e passar férias. Mas é o oposto que acontece. Portugal sofre, desde há décadas, de uma atordoante insensibilidade urbanística. Dou um exemplo: a azulejaria. Com efeito, se existe uma marca estética que nos distingue dos outros países, o azulejo é, indubitavelmente, uma delas. É verdade que o azulejo foi utilizado em diversos países. No entanto, foi em Portugal que assumiu uma importância artística fundamental, não só por causa da sua longevidade (sem interrupções desde o século XV), mas também pela originalidade do seu uso, nomeadamente quando empregue como elemento estruturante da arquitectura. Acaso haverá países com um tão rico património arquitectónico em azulejaria? Não creio. A diferença é que a maior parte dos países da Europa, onde oficialmente nos inserimos (apesar de nos perturbar, por vezes, a assunção das nossas diferenças) não abdicam, no que às cidades diz respeito, do valor arquitectónico das suas casas. Nós não. Começámos por achar que os azulejos eram coisas dos emigrantes, que ostentavam cá dentro o que não faziam lá fora, esquecendo que o que estava realmente em causa se resumia ao sentido estético de cada um. Depois, foi o desbaratamento perverso de um património riquíssimo. Por isso, o azulejo está, hoje, praticamente esquecido nas nossas construções. As cidades revelam-se, assim, um espelho do que somos: um povo demasiado volátil e inseguro. Por isso, é urgente confluir, no âmbito programático do próximo governo que sair das legislativas, num novo paradigma de intervenção sobre e para Portugal. Em nome de todos nós, em nome também das gerações futuras.

(publicado no jornal Público, em 22/05/2009)

os 50 anos do cristo rei

A cobertura da RTP sobre os 50 anos do Cristo-Rei é revelador dos resquícios salazaristas que se mantêm na sociedade portuguesa. Ouvir os comentadores (Marcelo Rebelo de Sousa, um padre que não me recordo agora do nome) e, principalmente, a apresentadora da emissão, Fátima Campos Ferreira é, por vezes hilariante. Não ouvi o discurso ecuménico do Cardeal Policarpo, mas estou em crer que foi menos papista do que estes três.

sexta-feira, maio 15, 2009

alegre não sai

Alegre não sai, afinal, do Partido Socialista. "Ajudei a fazer este partido", afirma ele, pacatamente orgulhoso. Ora, a leitura que se deve fazer é diferente. Alegre vai ser o próximo candidato presidencial contra Cavaco Silva. Possivelmente, vencerá mesmo as eleições. Estando fora do PS, transforma-se num verdadeiro pré-presidente. Não entregou o cartão, é certo, mas sabe que só assim, com a não-aceitação do convite de Sócrates (que veio mesmo a calhar), se colocará como um conglomerador de vontades, mesmo que contraditórias entre si.

quinta-feira, maio 14, 2009

a visita do papa a israel

Desta vez, Bento XVI parece ter acertado do ponto de vista discursivo. Sem gafes e com coragem, o Papa tem realizado, sob o ponto de vista ecuménico e social (e político), uma excelente visita a um território que teima em abdicar da paz. É precisamente neste difícil campo da religião, onde se cruzam diversas espiritualidades faccionadas e fundamentalistas, que o chefe máximo de uma igreja pode contribuir, de modo decidido, para o apaziguamento do território. Neste sentido, nunca é de mais notar a claridade de Bento XVI: insurgiu-se contra o muro que divide Israel da Palestina e a favor dum estado palestiniano independente.

terça-feira, maio 12, 2009

touradas e religião

Sou contra as touradas e sou contra o rastejamento no santuário de Fátima. Pelas mesmas razões.

segunda-feira, maio 11, 2009

a ubiquidade

Não consigo entender como é que Vital Moreira continua a defender Elisa Ferreira e Edite Estrela com o espantoso argumento da lisura e transparência, quando, por exemplo, uma delas (Elisa Ferreira) explica que está na lista (do PS para o Parlamento Europeu) apenas para dar o nome. Que raio de país é este que aceita, do ponto de vista legal, esta ubiquidade? Não preconizará esta atitude uma clara postura de uma sociedade que desenvolve as disparidades sociais? Quando se evoca a nobreza da política, não posso deixar de esboçar comparações. Aquando da candidatura de Mário Soares a deputado europeu, ninguém apostava que permanecesse em Bruxelas até ao fim do mandato. São pequenas (grandes) diferenças que fazem toda a diferença.

sábado, maio 09, 2009

vasco granja e outros

Ouvi, aquiescente, outro dia na rádio Pedro Rolo Duarte falar sobre o Vasco Granja a propósito da sua competência como comunicador de televisão. Na verdade, Vasco Granja faz parte de uma sólida galeria de apresentadores televisivos que já desapareceram (três ou quatro irreflectidos nomes: Vitorino Nemésio, João Villaret, Sousa Veloso). E o que une, afinal, estes homens e mulheres que marcaram a história da televisão em Portugal? Acaso eles teriam hoje alguma hipótese em qualquer casting para emprego, tendo aos seus lados a excelência da comunicação televisiva actual (o itálico é totalitariamente irónico)? Não, não teriam. Seriam simplesmente esmagados pela concorrência, pois não possuíam o marketing comunicativo que faz parte integrante de qualquer aspirante a apresentador.
Vivemos, pois, uma época da plastificação, a qual se ramifica nos mais variados sectores da sociedade. A política, evidentemente, não foge a esta regra inexorável.

futebol e televisão

Num tempo não muito distante, as três últimas jornadas do campeonato de futebol jogavam-se, obrigatoriamente, à mesma hora e no mesmo dia, com todas as equipas que disputavam lugares entre si. Pelos, vistos, já nem isso acontece neste mundo do futebol televisivo.

a meningite em áfrica e a gripe A

O vírus da gripe A matou já 49 pessoas em todo o mundo. A meningite, no continente africano, já provocou a morte de mais de 1000 pessoas. Acontece que, em África, a morte anda de braço dado com a vida, muito mais que no resto do mundo. Acontece também que a gripe A apareceu no México, onde milhares de turistas costumam, neste período, organizar as suas férias. Em África, as férias não são paraísos. Na Nigéria, estão diagnosticadas cerca de 17000 pessoas que contraíram a doença, muitas delas crianças que não chegarão a adultos. Aqui, o paraíso chama-se sofrimento. E poucos há que se importam.

a crise e o bairro da bela vista

Sei que a tensão social é grande e a crise tem costas largas. Sei também que vivemos uma época difícil, a qual, sublinhe-se desde já, não é de agora. Na verdade, entrámos no novo milénio com um conjunto de excluídos e pobres perfeitamente desadequados para uma sociedade que se quer evoluída. A título de exemplo, e de acordo com o professor Bruto da Costa (2008), 46% dos portugueses passaram pela pobreza entre 1995 e 2000. Do mesmo modo, muitos destes pobres viveram, neste quinquénio, situações de privação extremadas. Podemos observar este facto quando nos deparamos com as elevadas percentagens de agregados familiares sem condições habitacionais condignas (cozinha, banho, água corrente, aquecimento, mau estado de conservação, humidade nas paredes, janelas e chão apodrecido…). Curiosamente, o estudo de Bruto da Costa revela, neste campo da habitação, que mesmo entre os denominados “nunca pobres”, 50% não possuíam (e não se vislumbra que a sua situação se alterasse) uma casa adequadamente aquecida (uma boa explicação para a quantidade de pessoas que perambula nos centros comerciais) e 25% acusavam humidades nas paredes de casas.
Somos, pois, um povo habituado a viver em crise. Estivemos perto de uma bancarrota na década de 80 (o que originou um bom governo do chamado Bloco Central, liderado por um bom primeiro-ministro – facto injustamente esquecido – que se chama Mário Soares) e, daí para cá, fomos evoluindo para uma sociedade cada vez mais desigual, onde os ricos se tornaram cada vez mais ricos e os pobres se afundaram cada vez mais nos seus desafortunados quotidianos. Por isso é que, vencida a crise, é imperioso que se extingam, de forma clara, todas estas desvirtudes.
Porém, em tempo de campanha eleitoral, os partidos políticos tendem a optar por uma linha discursiva que vá ao encontro daquilo que o seu eleitorado espera ouvir. Foi o que aconteceu, há dias, com o PCP. Com efeito, justificar com a crise social que se vive os acontecimentos que abalaram o problemático bairro da Bela Vista, em Setúbal, onde grupos de bandos armados desatam aos tiros, é de uma enorme irresponsabilidade. Por muito de esquerda que se queira parecer, como acontece com Jerónimo de Sousa e o PCP, este procedimento não tem, infelizmente, uma resposta adequada do ponto de vista social ("não pensem que resolvem isto com batalhões de polícias", aferiu o líder do PCP). Pelo contrário (e também infelizmente), este tipo de comportamentos só se pode enquadrar no âmbito da criminalidade. E, quando assim é, a resposta policial não pode ser desigual. No bairro da Bela Vista vivem pessoas que merecem todo o nosso respeito. E estou propenso a crer que são precisamente estas pessoas que se levantam todas as manhãs para irem trabalhar e que levam os filhos às escolas que desejam, por parte da polícia, uma verdadeira protecção.
O protesto social é outra coisa.

quarta-feira, maio 06, 2009

o secretário de estado, os comunistas e a manifestação

O sr. Walter Lemos, secretário de estado da educação, não arranjou melhor maneira para contestar a manifestação dos professores agendada para o final do mês, do que afirmar que os sindicatos estão feitos com o Partido Comunista. Já não há mesmo palavras para comentar a tontice. No caso deste secretário de estado, começa a ser mesmo muito preocupante.
O que fará este senhor na vida?

a nossa televisão pública

Um jornalista da RTP, chamado Luís Baila, andou, no final do jogo entre o Arsenal e o Manchester, a chatear meio mundo por causa da "portentosa" exibição do "melhor jogador do mundo". Coloco aspas porque são expressões do Luís Baila, que as repetiu, ad nauseam, na peça que os variados telejornais da estação transmitiram entre ontem e hoje. Falando sério: é tempo da estação pública de televisão parar com esta semeação de provincianismo. As perguntas exibidas na televisão ao treinador do clube inglês, ao próprio Ronaldo e a um outro jogador (da equipa perdedora) deveriam envergonhar este serviço público de televisão.

terça-feira, maio 05, 2009

as desculpas do pcp

Por que raio deveria o PCP pedir desculpas ao PS relativamente ao que aconteceu no 1º de Maio? Acaso eram militantes do PCP os injuriadores? E desde quando é que uma iniciativa comemorativa da CGTP se espelha como uma actividade do PCP? Quem, afinal, se quer aproveitar deste incidente?
Basta ouvir o Vital e o Vitalino (Canas) para descobrirmos a resposta.

campanhas

Nada como uma campanha eleitoral para conhecermos os políticos. Então quando em vez de uma se juntam três num escasso espaço de tempo, as coisas parecem fluir condignamente. Vivemos um tempo estranho. Comentadores, jornalistas, políticos, os chamados opinion makers têm tido muito trabalho. Tanto que passam a vida a analisar aspectos interessantes da política como, por exemplo, os cartazes eleitorais, designadamente aqueles que habitam as rotundas, cruzamentos e entradas das cidades. Neste campo, Manuela Ferreira Leite foi crucificada. De facto, nada como os preconceitos para nortear o comentário político. A própria tem, naturalmente, culpa: não é propriamente uma ave rara na política (foi ministra da educação e das finanças no consulado cavaquista e não deixou saudades). Mas também é verdade que nunca foi líder partidária e sempre se pautou como uma espécie de D. Sebastião social-democrata (um outro com idêntico carisma que, felizmente, se tem vindo a esvaziar é António Borges). Ou seja: foi paulatinamente erigindo uma imagem que deveria ter uma resposta em consonância com o cargo que ocupa (cargo esse para o qual foi demasiado impelida, deve-se sublinhar). E não é isso que se tem vindo a passar. Muito por culpa dela, decerto, mas também por culpa da imprensa. Vejamos os casos dos cartazes.
Colocando lado a lado os primeiros cartazes do PS e do PSD por que razão foi o de Manuela Ferreira Leite tão torturado? Acaso estará o do PS melhor elaborado, tanto do ponto de vista artístico (o que de isso tem de subjectivo) como também no que diz respeito à mensagem que pretende transmitir? Não será a sobriedade uma imagem de marca da candidata? O fundo cinzento-escuro não estará, do ponto de vista da mensagem global (política, pessoal, social, psicológica), idealizado de forma eficaz, comparando com os tons monárquicos em que Vital Moreira aparece, sem prescindir da sua própria assinatura? Porquê então este purgatório para a líder social-democrata? A resposta carece de análise mais cuidada, mas passa, incontornavelmente, pela imprensa que temos.
Manuel Pinho referiu-se deste modo a Paulo Rangel: "tem de comer muita papa Maizena para chegar aos calcanhares de Basílio Horta". O assunto que está subjacente a este extraordinário pensamento liga-se ao projecto que o candidato ao Parlamento Europeu do PSD atentou, o qual preconiza um Erasmus para o primeiro emprego. Basílio Horta comentou em tom crítico Rangel, afirmando que tal projecto - conhecido por Vasco da Gama - já existe. Ora, o cabeça de lista social-democrata estranhou que um "agente administrativo" tenha intervido directa e objectivamente na campanha eleitoral. Tem razão? Não tem razão? Não interessa. O que de facto interessa são as patatadas de Pinho, essa excelência da política portuguesa que disse o que disse. Os eleitores gostam? Claro que gostam (que falta faz uma boa escola num país). Os jornais apreciam? Obviamente.

coisas

vamos pela estrada e sentimo-nos bem. lá fora, o vento sopra, a neve cai, voam duas aves perdidas. eu sei que tenho de chegar a algum lugar...


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