domingo, setembro 28, 2008

supostos furos jornalísticos

Eu sei que Alberto Martins, quando abre a boca politicamente, fá-lo, normativamente, de forma evasiva e pouco clara a entendimentos directos, o que resulta, na maior parte da vezes, numa inocuidade de sentido verdadeiramente perversa. "É um político", dirão alguns, resignados com este tipo de procedimento, habituados a escutar o acostumado e oportuno laconismo desta classe profissional nas diversas comunicações ao povo português, seja através de conferências de imprensa, seja no Parlamento ou mesmo (principalmente) em entrevistas de maior ou menor extensão.
Todavia, retirar da entrevista que o líder da bancada parlamentar do Partido Socialista concedeu ao programa Diga lá Excelência (Rádio Renascença e Público) uma espécie de furo jornalístico que a imprensa titula de alterações políticas (com maior ou menor grau de variabilidade enfática) entre Cavaco Silva e a maioria socialista é um passo que só um jornalismo pouco sério consegue empreender. É que as alterações políticas resumem-se, tão somente, a dois vetos presidenciais, de manifesta importância, os quais têm que ver com variantes marcadamente (in)constitucionais e de correlação entre diversos órgãos de soberania (Estatuto dos Açores) e também com outro tipo de agendamento político - este de feição mais social (embora de importância constitucional igualmente relevante) - que é a Lei do Divórcio, cujo delineamento preconiza mudanças que, não sendo radicais, implementariam um novo paradigma nas relações matrimoniais que avistam, na sua forma litigiosa, o seu término.
Na verdade, o que Alberto Martins reflectiu na entrevista foi que a relação constitucional funciona de "forma harmónica, equilibrada" e que houve divergências políticas entre Governo e Presidência a respeito destes dois casos. Ora, cada veto presidencial corresponde, naturalmente, a uma divergência política. Daí que se chame veto, isto é, proibição, recusa, suspensão (de uma lei) e que o mesmo seja uma prerrogativa constitucional do Presidente da República enquanto órgão de soberania último da autonomia nacional, que jurou cumprir e fazer cumprir a Constituição da República. Assim, se nos orientarmos por este tipo de sofreguidão jornalística, nomeadamente no que aos títulos da imprensa escrita e abertura de telejornais diz respeito, não fazíamos mais nada do que analisar, de forma deprimente, as "alterações políticas" entre as duas maiorias eleitas pelo povo português. É que Cavaco Silva já utilizou a arma da não promulgação e devolução dos diplomas ao Parlamento (o veto político) noutras questões socialmente relevantes. Só em Agosto do ano passado, Cavaco vetou por três vezes igual número de diplomas governamentais: a lei orgânica da GNR, o estatuto dos jornalistas e o diploma sobre a responsabilidade civil extracontratual do Estado. Não se falou, na altura, de alterações institucionais "delicadas" entre governo e presidência. No entanto, a pouco mais de meio ano de eleições legislativas, autárquicas e europeias, tudo serve para perscrutar sinais de divergências. Tudo isto não passaria de relevâncias fugazes se não se iniciasse, a partir de agora e até Junho ou Julho, um acompanhamento delirante de todas as mensagens políticas originárias de ambas as partes. Infelizmente ou não (os jornalistas encontram-se, sem sombra de dúvida, nesta última hipótese), não falta ao governo porta-vozes do disparate. Pelo outro lado - o lado presidencial - a companhia também não é famosa, se tivermos em conta as vozes que se alevantam sistematicamente de forma contraditória, em que Manuela Ferreira Leite, no seu perfil cavaquista, se empenha em não criar ondas de choque com o seu presidente. Resta-nos a nossa própria capacidade de discernir o que é ou não relevante na mensagem política sabendo que, muitas vezes, políticos e jornalistas andam, ardilosamente, de braço dado.

Sem comentários:

coisas

vamos pela estrada e sentimo-nos bem. lá fora, o vento sopra, a neve cai, voam duas aves perdidas. eu sei que tenho de chegar a algum lugar...


neste momento...