domingo, setembro 07, 2008

o silêncio e o discurso de manuela

Tenho pena de não ter ouvido e visto o discurso de encerramento de Manuela Ferreira Leite na Universidade de Verão do PSD. Porém, li o que a imprensa começou, desde logo, a esboçar. E nisto o que interessa é começar. Aparece um comentador e começa a zurzir na candidata, nomeadamente naquilo que foi o leitmotiv do seu registo discursivo. Depois, há um encadeamento de críticas, as quais não se deslocam dum ponto de vista predeterminado. No caso em questão, não era preciso ser-se bruxo para vislumbrarmos a inevitabilidade das críticas a que a líder do PSD se sujeitou. Mas sejamos justos: a responsabilidade primeira pertence, essencialmente, à própria, principalmente com a criação dessa imagem esfíngica, à Cavaco Silva, imagem essa que acaba sempre por resultar num vazio para quem espera alguma coisa deste tipo de pessoas. Veja-se a desastrosa comunicação de Cavaco Silva ao país sobre os Açores (alguém se lembra do tema?) e o que disseram os opinion makers da nossa praça, excepção feita, é claro, ao interessante sectarismo do Vasco Graça Moura e do Pacheco Pereira. Por isso, Manuela Ferreira Leite não podia escapar ao crivo implacável dos críticos. Neste sentido, a questão que se deve colocar é, pois, a seguinte: foi mau o discurso de Manuela Ferreira Leite? É evidente que não. Mais: o que Manuela Ferreira Leite disse em Castelo de Vide foi precisamente o que todos queriam ouvir, pois foi claramente um discurso de oposição. Abordou a economia, a segurança, a competitividade focalizada essencialmente nas pequenas e médias empresas, o endividamento a prazo do Estado, criticou os políticos que se movem por interesses pessoais em vez de olharem com nobreza para a política como uma causa exclusivamente pública (o que deve ser abertamente combatido através dum tipo de discurso que vá ao encontro das pessoas) e, como não podia deixar de ser, desenvolveu a temática do emprego através de frases tão embusteadas como "é no emprego que a política económica que defendemos melhor mostrará os seus resultados". De qualquer modo, o governo maioritário de José Sócrates consegue o incrível feito de colocar na boca de Manuela Ferreira Leite, ex-ministra das Finanças e ex-ministra da Educação, a dama de ferro portuguesa, as seguintes palavras: “o Governo confunde autoridade com autoritarismo”. Confesso que fiquei confuso e desejei, desde logo, a vitória dessa senhora em Junho ou Julho do próximo ano. Mas depois, mais lúcido, pensei que nestas coisas os melhores discursos são, por norma, os da oposição. E é nesta contextura que gostei também de ouvir Jerónimo de Sousa na festa do Avante.
Por isso, falar de logro político quando se critica a "reentrée" de Manuela Ferreira Leite é desaguar, desavergonhadamente, no espaço do logro jornalístico. O que se passa é que tanto Manuela como Sócrates já não conseguem qualquer tipo de transformação social no país. Nenhum deles é capaz de se deixar de retóricas economicistas (compreendo, finalmente, o desabafo de Clinton "it's the economy, stupid") e pregar simples. É o que, no fundo, todos queremos ouvir: a evidência dum linguajar simples e cintilante. São poucos os que o conseguem.

(publicado em A Voz de Trás-os-Montes em 11-9-2008)

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