terça-feira, setembro 23, 2008

o discurso de josé sócrates em guimarães

Muito se falou do discurso que marcou a “reentré” política do Partido Socialista, em Guimarães, e que teve como principal figura José Sócrates. Eu disse principal figura? Na verdade, o primeiro-ministro lembrou-se de levar para o púlpito socialista (onde milhares de pessoas, vindas de autocarro de todo o país, aguardavam, ansiosamente, a mensagem ministerial) a Ministra da Educação, Maria de Lurdes Rodrigues, como símbolo maior destes quase quatro anos de governação maioritária. Para mim, foi este o facto de maior relevância no assomo socrático. O resto, foi um enchimento retórico, sem qualidade conteudística de alguma espécie, destinada a um bater de palmas quase programado, seguido, aqui e além, de uns ululantes e estridentes assobios.
À direita e à esquerda, Sócrates não deixou de espicaçar os adversários, com particular destaque para as questões sociais, designadamente o PSD que, com a sua tendência genética (ainda mais) liberal, poderá colocar em causa uma vitória nas próximas eleições. Daí as frases, venenosas: “queremos uma segurança social pública. É aqui que está a fronteira entre a esquerda e a direita, uma diferença social”! E quanto aos partidos de esquerda, que acusam José Sócrates de conduzir o país precisamente através da cartilha neoliberal (o que cola, inevitavelmente, o PS ao PSD), o orador não perdeu muito tempo, tudo em nome da modernidade, isto é, da esquerda moderna com que saiu vitorioso em 2005.
Só que foi muito mal aconselhado quando lhe disseram que a melhor companhia ministerial que podia ter em palco era Maria de Lurdes Rodrigues. Porquê? Tão simples quanto isso: a ministra da Educação espelha o que de pior tem vindo a ser feito, ao longo destes anos, na área educativa (sinceramente, pensava que tal não fosse possível). Mais: falando de uma esquerda social, José Sócrates levou para Guimarães uma ministra que tem demonstrado um longo e horripilante autismo nesta área. Basta lembramo-nos o que têm sido as suas declarações aos vários protestos dos professores a respeito, por exemplo, da questão da avaliação e da divisão absurda que foi a invenção de patamares profissionais. Ou o modo como aborda a questão dos professores contratados há longos e desesperantes anos. Por isso, as palavras laudatórias e tontas de José Sócrates à ministra, nas quais chega mesmo ao ridículo de sublinhar que “sem a determinação e coragem da ministra, não teríamos os resultados que podemos apresentar” e que “nós, socialistas, é que temos orgulho em tê-la como nossa ministra”, são reveladoras que entre a esquerda retórica (que ele, paradoxalmente, satiriza) e a “esquerda de acção” (auto-elogio socrático) vai, de facto, um grande e descomplexado passo.

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vamos pela estrada e sentimo-nos bem. lá fora, o vento sopra, a neve cai, voam duas aves perdidas. eu sei que tenho de chegar a algum lugar...


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