Eu até podia compreender - embora mal - a entrega das chaves da cidade de Lisboa a Durão Barroso, mesmo que seja o terceiro português a congratular-se de tal oferenda (pelo que leio nos jornais, as chaves da cidade estão mais predestinadas a chefes de estado estrangeiros). Eu até podia compreender que a Câmara de Lisboa quisesse agraciar um lisboeta que agora é Presidente da Comissão Europeia e não vislumbrasse uma outra maneira de o fazer. O que eu sinceramente não compreendo é a pacovice de António Costa ao afirmar, com o penduricalho ao pescoço, que "pela primeira vez, um cidadão português residente na cidade de Lisboa desempenha o elevado cargo de presidente da Comissão Europeia" e que tal cargo "constituiu uma honra para Portugal e para a cidade de Lisboa".
Mas quem disse a António Costa que constitui uma honra par Portugal? Que ele, como cidadão e presidente da Câmara Municipal de Lisboa, se sinta orgulhoso por ter Barroso como presidente da Comissão Europeia é um assunto que só a ele (e à Câmara) diz respeito. O que não pode é falar em nome do país.
Pela parte que me toca, continuo a achar que o que Durão Barroso fez, naquele ano de 2004, ao combinar, com o Presidente da República Jorge Sampaio uma ida para Bruxelas (depois de outros primeiros-ministros, de outros países, terem consciente e patrioticamente recusado o cargo de presidente da Comissão), com a condição de deixar a chefiar o governo o inenarrável Santana Lopes, representou uma vergonha para o país, visto que foi eleito um primeiro-ministro que, ao mínimo aceno, virou as costas a um mandato para o qual tinha sido escolhido. É que isto de ser primeiro-ministro de Portugal não é o mesmo que ser treinador de futebol, em que, de uma maneira ou de outra, todos sonham em treinar o Manchester United. Até porque, para um português que se preze - e, felizmente, ainda deve haver muitos - poder estar à frente de um governo da República deve constituir, acima de tudo, uma honra que só com um forte sentido de missão deve ser desempenhado. Durão Barroso demonstrou, portanto, que, em Portugal, só serve mesmo para ficar com umas chaves no bolso. Ainda que não abram porta alguma.
(esboço do artigo publicado na Voz de Trás-os-Montes em 15/5/2008)
1 comentário:
Muito boa análise.Parabéns!
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