domingo, dezembro 16, 2007

o paradigma de Valter Lemos

O que me espanta é o seguinte: como é que alguém que não entende nada de educação ocupa um prestigiado cargo de secretário de estado no ministério da educação?! Lendo-o hoje no Público fica-se com uma ideia clara sobre o que vai na cabeça daquele homem relativamente a propostas educativas em particular e educação em geral. E o que por lá vai pairando nestes dias, decerto com grandes vazios e interiores tumultuosos, é que em Portugal se reprova muito ao nível do 3º ciclo (por isso a revisão do ensino básico ao nível deste ciclo é uma das medidas que estão sendo estudadas para atenuar este problema, segundo se esclarece no jornal), e que os professores recorrem demasiadas vezes a este "sistema de recuperação dos alunos" (sic). Assim, advoga que "não serve de nada tentar mudar a situação de forma administrativa", pois "a reacção iria ser: 'Lá estão eles a facilitar'". Depois, claro, traz à colação os exemplos do seu próprio paradigma, como a Finlândia, entre outros. Acrescenta, impetuosamente, que "Temos o problema de ter provavelmente as mais duras transições de ciclo da maior parte dos países. De um ano para o outro, os alunos mudam de espaço físico, de número de professores, de organização de tempo de estudo". Deste modo, o nosso governante olha com olhos de investigador para os índices de retenções e desde logo declara que vai atacar o 3º ciclo, esquecendo que atrás do terceiro se encontra o segundo, alicerce cognitivo e pedagógico-didáctico daquele.
Mas quer lá saber Valter Lemos dos 5º e 6º anos de escolaridade, das turmas com 28 alunos de 10 e 11 anos, das salas inconcebíveis, do espantoso tecido curricular do 2º ciclo (v. http://www.dgidc.min-edu.pt/curriculo/Programas/programas_2ciclo.asp) que impinge bloco e meio de Educação Física (meio bloco quer dizer 45 minutos a esta disciplina), 225 minutos por semana a disciplinas tão redutoras como Estudo Acompanhado (90 minutos), Área de Projecto (90 minutos) e Formação Cívica (45 minutos), e não dedica um minuto a uma segunda língua estrangeira, às novas tecnologias (deixa isso para o 3º ciclo) ou a um reforço da carga horária da língua materna. O que de facto interessa, na cabeça inócua deste governante, são as taxas de retenção, até porque os paradigmas finlandeses não se coadunam com este tipo de "sistema de recuperação".

(publicado no jornal Público em 18/dezembro/2007)

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