domingo, fevereiro 14, 2010

os des-patriotas

O que fará um proeminente deputado europeu comportar-se, num tonitruante discurso parlamentar, como se vivesse num exílio, longe – imperativamente longe – da sua pátria amada? A resposta: a sua pre-candidatura a líder do seu partido. Na verdade, o que Paulo Rangel fez em Estrasburgo, acusando Portugal de ser um país em que se vive informativamente obstruído foi completamente despropositado e inglório, ao nível daqueles que andaram por Lisboa vestidos de branco a reclamarem os mesmíssimos pressupostos. Eu sei que somos um país muito sensível a estas coisas. Vivemos oprimidos durante quarenta e nove anos de ditadura, em que a mesa ao lado no café (ou no restaurante) podia não ser uma mesa mas antes um deformado auricular. Sei também que só nos fica bem, enquanto cidadãos, esta preocupação. Mas também sei que, nestas matérias (como noutras) os excessos são, geralmente, contraproducentes. Os de branco calaram-se rapidamente; Rangel redimiu-se na apresentação da sua candidatura, a qual, diga-se desde já, entoou uma linha bem ao jeito de Manuela Ferreira Leite (disse: "O primeiro objectivo de um governo de ruptura, que queira salvar o bem-estar das gerações presentes e a sobrevivência condigna em Portugal das gerações futuras, só pode ser um e esse mesmo: criar condições para libertar o futuro dos encargos até aqui contraídos". Manuela sublinhou esta ideia vezes sem conta na campanha para as legislativas. Tem, no entanto, um problema: a sua imagem não passa nos rectângulos televisivos. Rangel, aparentemente, ultrapassa com alguma distinção esse inconveniente).
A respeito deste episódio lembrei-me do sentido de pátria instituído, por exemplo, por Teixeira de Pascoaes (um ser vivo superior aos indivíduos, um ser espiritual que depende da vida individual), e a respeito disto tudo lembrei-me de ver Laborinho Lúcio, há tempos, na televisão, desenvolvendo uma ideia crítica sobre a justiça em Portugal. A sua reflexão ia num sentido preciso: Portugal carece de cultura cívica. Neste sentido, é comum vermos réus e testemunhas faltarem, desassombradamente, às sessões de julgamento, sem que nada lhes aconteça ao nível da responsabilização pessoal. Adiantou ainda o ex-ministro da justiça que, num fórum europeu sobre justiça, perguntara, semanas antes, a um colega alemão o que é que acontecia no seu país, se alguns destes protagonistas não comparecesse a uma sessão de julgamento. O alemão ficou incrédulo com a questão e, de imediato, retorquiu: "mas em Portugal faltam?" "Não", respondeu, Laborinho, "só perguntei por curiosidade".
Rangel teria aproveitado para berrar aos microfones do fórum. Quero, no entanto, acreditar que não.

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vamos pela estrada e sentimo-nos bem. lá fora, o vento sopra, a neve cai, voam duas aves perdidas. eu sei que tenho de chegar a algum lugar...


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