A já não tão curta história da democracia portuguesa abarca complacentes episódios, mais ou menos anedóticos. Em 74 e 75 vivemos sob brasas, em que o virar da esquina era sempre uma grande interrogação. Nasceram e renasceram, porém, neste período, verdadeiros líderes, os quais edificaram, estruturalmente, o edifício democrático do país. Depois disso, depois do alcançamento da sonhada Europa, a nação transfigurou-se. Vieram novos líderes partidários e inventaram-se as jotas, agremiações de miúdos que ansiavam (e anseiam) pela política e falavam (e falam), alegadamente, por todos os jovens do país. Granjearam, em nome dessa juventude que se tornou moda, assento parlamentar e muitos deles reformaram-se (reformam-se?)com trinta e tal anos, em nome das radicais leis de aposentação dos deputados. Outros houve, no entanto, que fizeram da política a sua casa, desprezando, de certa maneira, tudo que é próprio no currículo de cidadãos "normais", que é estudar e depois trabalhar, mesmo que consideremos laboralmente a política.
O enquadramento político-ritualista das juventudes partidárias criou, em grande medida, portanto, uma espécie modus faciendi político fundamentalmente diferenciador dos da primeira geração da nossa democracia. A política como meio individual para chegar a algum lado - nem que seja a um curso superior - sobrepôs-se à política dos valores, feita em nome do bem comum. Se quisermos, é o individualismo - matriz liberalizador da sociedade - a suplantar o coletivo.
É neste contexto que surgem os Relvas do sistema. Trabalhadores incansáveis, o seu dinamismo e aparente subserviência ao líder cedo denotam uma capacidade indefetível de sustentação colegial e até de uma certa honestidade intramuros. O grupo que o sustenta não difere muito deste tipo de operacionalização política.
Os Relvas são participativos, subservientes, incansáveis, hipersociáveis, mas também são perigosos. Não para eles, não em grau superior para o partido. A perigosidade dos Relvas da nossa democracia desagua inexoravelmente no país, principalmente quando, de um dia para o outro, os seus currículos ocultos se transformam em currículos oficiosos do regime. Ser ministro, para os Relvas, é o começo de tudo.
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