domingo, outubro 03, 2010

pacotes

Numa tonitruante e assustadora espiral de descontrole político, José Sócrates desdobra-se em entrevistas televisivas quando se deveria antes preocupar, por exemplo, em debater seriamente os problemas da atual crise política (existe uma crise política, não usurpem esta realidade, senhores comentadores políticos). Aliás, uma sociedade que aceita como natural este tipo de comunicação propagandística, não vive, de todo, uma existência saudável. Sócrates tem-se revelado igual a ele próprio: compulsivo. Ele parte do princípio que uma verdade será mais verdadeira quanto as vezes que for propagandeada, isto é, vulgarizada.
O que ouvimos nestes últimos dias ao primeiro-ministro foi, no mínimo, desconcertante. Portugal, afinal, plantava-se como um país exequível, no caminho quase eterno da salvação. Na verdade, segundo Sócrates, tudo rolava: desde as receitas, que estavam "dentro do padrão de segurança" para 2010, passando pela extraordinária previsão de crescimento, a qual foi mesmo superada para o dobro (de 0,7% para 1% no final do ano). Pelo meio, ainda garantiu (a ele é que ninguém o cala!...) a oportunidade de proclamar o ritual vocabular da confiança: "a questão principal é de confiança. O que o país precisa são palavras de confiança", afiançava José Sócrates em resposta ao deputado Miguel Macedo na Assembleia da República, aquando do último debate quinzenal. De facto, num país de tolos, isto bastaria para a exequibilidade de um Governo, de um qualquer Governo. Acontece que Sócrates divulga essa sua crença desde sempre, principalmente desde que iniciou a saga dos PEC's. Os dislates foram já tantos desde esse tempo já tão inacessivelmente memoriável que teríamos de ter muita paciência para os determinar com equidade. De pacote em pacote, de preferência enrolando o aparentemente incauto Passos Coelho - obrigando-o mesmo a um inacreditável pedido de desculpas públicas escassos dia após ter sido eleito líder do seu partido - José Sócrates (escrevi por engano trocas-te, o José do Contrainformação...) tem levado a sua carta a Garcia.
Cavaco Silva, o presidente que percebe de finanças, principalmente quando este autopanegírico se revela muito útil em campanhas eleitorais (vamos ver se dentro de uns meses continua com este tipo de vestidura), tem sido, durante estes meses de PEC's, um mero espetador, seguramente atento. Por isso não entendo como é que o Presidente da República fez orelhas moucas à sua ex-ministra das finanças, Manuela Ferreira Leite, quando esta liderava o PSD, e se preocupa agora tanto com a suposta estabilidade governativa, condicionando - e muito - qualquer voto negativo ao Orçamento de Estado por parte do maior partido da oposição. Que eu saiba, a demissão de Sócrates (Cavaco não a pode, constitucionalmente, encetar e suspira, por isso, de alívio) não proclamaria um país em estado de sítio, nem de desgoverno permanente. Ao sugerir isso, o que se faz não é mais do que a entoação de exageradíssimas e imerecidas loas a José Sócrates na estratégica construção fictícia do homem certo no lugar certo. Por conseguinte, o nim parlamentar que tantos esperam por parte do PSD não é, para mim, tão certo quanto aparenta. Com efeito, não se pode discordar tanto e outorgar simultaneamente.
Num momento destes, são precisos verdadeiros políticos, daqueles que conseguem vislumbrar um país para além de dois ou três meses. Infelizmente, parece que estes são espécimes em vias de extinção. Os que por aí pairam, assemelham-se mais a encaminhamentos tentaculares em prol do deus-mercado do que a homens e mulheres com verdadeiro sentido republicano.

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vamos pela estrada e sentimo-nos bem. lá fora, o vento sopra, a neve cai, voam duas aves perdidas. eu sei que tenho de chegar a algum lugar...


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